"MAIOR É O QUE ESTÁ EM VÓS DO QUE O QUE ESTÁ NO MUNDO." (I JOÃO 4:4)

quarta-feira, março 31, 2010

Só dê ouvidos a quem te ama

Pe. Fábio de Melo



Só dê ouvidos a quem te ama. Outras opiniões, se não fundamentadas no amor, podem representar perigo. Tem gente que vive dando palpite na vida dos outros. O faz porque não é capaz de viver bem a sua própria vida. É especialista em receitas mágicas de felicidade, de realização, mas quando precisa fazer a receita dar certo na sua própria história, fracassa.

Tem gente que gosta de fazer a vida alheia a pauta principal de seus assuntos. Tem solução para todos os problemas da humanidade, menos para os seus. Dá conselhos, propõe soluções, articula, multiplica, subtrai, faz de tudo para que o outro faça o que ele quer.

Só dê ouvidos a quem te ama, repito. Cuidado com as acusações de quem não te conhece. Não coloque sua atenção em frases que te acusam injustamente. Há muitos que vão feridos pela vida porque não souberam esquecer os insultos maldosos. Prenderam a atenção nas palavras agressivas e acreditaram no conteúdo mentiroso delas.

Há muitos que carregam o fardo permanente da irrealização porque não se tornaram capazes de esquecer a palavra maldita, o insulto agressor. Por isso repito: só dê ouvidos a quem te ama. Não se ocupe demais com as opiniões de pessoas estranhas. Só a cumplicidade e conhecimento mútuo pode autorizar alguém a dizer alguma coisa a respeito do outro.

Ando pensando no poder das palavras. Há palavras que bendizem, outras que maldizem. Descubro cada vez mais que Jesus era especialista em palavras benditas. Quero ser também. Além de bendizer com a palavra, Ele também era capaz de fazer esquecer a palavra que amaldiçoou. Evangelizar consiste em fazer o outro esquecer o que nele não presta, e que a palavra maldita insiste em lembrar.

Quero viver para fazer esquecer... Queira também. Nem sempre eu consigo, mas eu não desisto. Não desista também. Há mais beleza em construir que destruir.

Repito: só dê ouvidos a quem te ama. Tudo mais é palavra perdida, sem alvo e sem motivo santo.

Só mais uma coisa. Não te preocupes tanto com o que acham de ti. Quem geralmente acha não achou nem sabe ver a beleza dos avessos que nem sempre tu revelas.

O que te salva não é o que os outros andam achando, mas é o que Deus sabe a teu respeito.

segunda-feira, março 29, 2010

O significado da bênção





Quando alguém te diz: “QUE DEUS TE ABENÇOE” não está só desejando o melhor para você, mas também atuando a seu favor.
Pois quando bendizes a alguém, também estás atraindo a proteção de Deus para você.
O efeito de abençoar é multiplicador, já que é dado por Deus a seus filhos.
A bênção invoca o apoio permanente de Deus para o bem-estar da pessoa,
fala de agradecimento, confere prosperidades
e felicidade em toda pessoa que a recebe da nossa parte.
A bênção começa com as relações de pais e filhos.
Os filhos que recebem a bênção da parte dos seus pais têm um bom começo espiritual e emocional de vida.
Recebem um firme propósito de amor e aceitação.
Este princípio também se aplica na íntima relação de casais.
As amizades se aprofundam e se fortalecem, trazendo companheirismo, saúde e esperança a todos que nunca receberam sequer uma palavra abençoada.

O poder da vida e da morte está na Palavra.
Ao abençoares não só está outorgando a vida aquele que a recebe, mas também aquele que também a dá.
Hoje eu peço que Deus te abençoe, porque ao bendizê-lo de todo coração, estou bendizendo a mim mesmo. (Em última instância, somos todos um!)
Distribua bênçãos por onde vás, não só palavras, mas, ações.
Elas retornarão a ti quando menos esperares.

Geralmente a pessoa que vive na presença de Deus, amando-O e abedecendo-O, tem o privilégio da sua Divina Bênção, sempre.

Que Deus Abençoe a todos.

sábado, março 27, 2010

História verídica dos que transcenderam a morte - Fim

Masaharu Taniguchi


Taniguchi - Sra. Ando, a doença que a senhora teve também foi resultante de atribulações e atritos mentais. Poderia contar sua história às pessoas aqui presentes?

Ando - Por onde começarei a falar sobre a origem da minha doença? Meu marido, que era militar, enlouqueceu e morreu depois de sofrer durante nove anos. Toda vez que ele entrava em crise, eu ficava tão angustiada que sentia um nó no peito. Às vezes pensava que seria preferível enlouquecer também. Na época, morávamos em Tóquio, e eu frequentava a seita Shiseiden, cuja fundadora os adeptos chamavam de "mãe". Normalmente, ela era uma pessoa alheada, que parecia não ter senso comum e não era capaz de responder à pergunta alguma. Porém, quando falava à respeito de Deus, tornava-se eloquente como se fosse outra pessoa. Eu ia às reuniões da seita todos os dias, mas acabei desanimando. Na época em que meu marido faleceu, ia muito raramente. A doença (loucura) havia transfigurado a fisionomia dele de modo assustador. Por isso, eu rezava muito para que, pelo menos na hora da morte, ele voltasse a ter uma fisionomia calma. E assim aconteceu: quando meu marido morreu, a expressão medonha desapareceu e o seu rosto refletia paz e serenidade. Senti-me grata a Deus, compreendendo que doença existe somente nesta vida fenomênica, desaparecendo com a morte física.

Taniguchi - Nessa época, a senhora não tinha dificuldade para ingerir alimento?

Ando - Na época, não. Depois é que passei a engasgar ao ingerir alimento, e eu precisava fazer força para engolí-lo. Às vezes, não conseguia engolir nada. O médico não sabia diagnosticar o que era; achava que podia ser atonia estomacal. Na época eu morava na casa de meu filho, na cidade de Mito. Meu estado foi piorando, e passeia vomitar. Voltei para a província de Iwate, onde consultei o dr. Nishina, no Hospital de Morioka; mas ele não revelou o nome da doença, adiantando que seria apenas necessária uma internação para saber se havia ou não a possibilidade de cura. Então internei-me. Da janela de meu quarto, avistava-se a frente da Caixa Econômica de Morioka, onde trabalha o sr. Katsumi Sato, mas eu não sabia disso, pois há muito tempo perdera o contato com ele. Outrora, ele e eu éramos grandes amigos, pois sua falecida irmã era minha colega de estudos. Como ia dizendo, eu estava internada no Hospital Morioka; pois bem: Aconteceu que um amigo do sr. Sato foi acometido de apendicite e internou-se no quarto ao lado do meu. Vindo visitá-lo, o sr. Sato viu meu nome na porta vizinha e entrou. Ao ver-me, disse surpreso: "Você está internada aqui?". Depois disso, visitou-me várias vezes. Acho que o reatamento da amizade com ele e o fato de eu ter sido conduzida à Seicho-No-Ie foram obras do espírito de sua falecida irmã.

Um dia, o sr. Sato disse-me para mudar de quarto porque a irmã dele aparecera-lhe em sonho nas últimas noites aconselhando a fazê-lo, pois aquele quarto não era bom. A minha acompanhante de quarto foi procurar a médium Hisako Kobayashi para falar com o espírito da irmã do sr. Sato. "Que espírito estranho. Está demorando para baixar" - dizia a médium, na longa espera. Finalmente o espírito baixou e disse: "Fui eu que apareci no sonho do meu irmão. Mude de quarto porque naquele existe um espírito mau". Mudei de quarto e continuei o tratamento, mas o meu estado foi piorando. O sr. Sato me fez a "terapia com imposição da mão" e ensinou-me a praticá-la também. Quando o sr. Yasukiyo Eguchi foi a Morioka ministrar um curso de "terapia com a imposição da mão", o sr. Sato o trouxe até o hospital para aplicá-la especialmente em mim. Foi cansativo porque eu estava muito enfraquecida. E mesmo depois disso o meu estado não melhorava: punha uma colher de arroz na boca e em seguida tomava água para que a comida descesse, mas logo em seguida a devolvia. Assim, para dois baldes de água e alimento devolvido por dia, parava no estômago apenas uns punhados. Em novembro, o médico disse que seria melhor eu voltar para casa e viver como bem entendesse, visto que não havia meios de melhora no hospital. Em casa, continuou o processo de ingerir alimentos e devolvê-los. Eu não sentia alegria nem esperança na vida. De quando em quando, vagueava cambaleando pelas ruas, pálida como um fantasma, e voltava para a cama. O sr. Sato visitou-me novamente, e na despedida ia esquecendo a revista O Espírito e a Vida, editada pelo Wasaburo Asano. Avisei-o, mas ele disse que já tinha lido todano trem e que a deixava para eu ler. Se não fosse aquela revista, eu jamais teria conhecido a Seicho-No-Ie, e não estaria viva hoje.

Taniguchi - Em carta, o sr. Sato diz que, como a senhora estava desenganada pelos médicos, queria apenas que soubesse como é a vida no mundo espiritual após a morte, e por isso levou-lhe aquela revista.

Ando - Ah! Então foi assim? Soube depois que o médico dissera que eu não passaria daquele inverno. Na época, não sabia de nada. Li então a revista deixada pelo sr. Sato de ponta a ponta, e, na última página, vi o anúncio da revista Seicho-No-Ie. O título "Extermínio das doenças crônicas" impressionou-me. Algo me dizia que somente essa revista poderia me salvar. Pedi os números 3 e 4 do ano II e li-os não sei quantas vezes. Lia-os diariamente. Enquanto lia, penetrou em meu coração uma voz, como que vinda do céu, que dizia: O homem não é corpo carnal; logo, pode viver sem comer. Por isso, na época eu dizia a todos: "Não vou morrer porque conheci uma maneira de viver sem comer". Um mês depois, meu filho veio visitar-me. Sentado à minha frente, olhava admirado para mim. "Por que olha tanto para mim?", perguntei. Ele respondeu: "A senhora está com aspecto saudável. Está completamente diferente de um mês atrás". Então percebi que, de fato, estava bem melhor. Passei um mês inteiro lendo os dois exemplares sobre o "Extermínio das doenças crônicas", e ao cabo desse período já estava conseguindo ingerir duas tigelinhas de alimento.

Nagata - Duas tigelinhas por dia ou em cada refeição?

Ando - Em cada refeição.

Nagata - Não era câncer, era?

Ando - Tiraram várias radiografias, mas na época não me contaram o resultado. Posteriormente revelaram que eu tinha câncer na entrada do estômago. Ficava abaixo das costelas, num local difícil para operar e suturar. Quando soube que eu estava melhorando, o médico ficou admirado e disse que gostaria de me examinar. Em um mês, como disse, melhorei a ponto de conseguir ingerir duas tigelinhas de alimento em cada refeição, mas depois disso o meu estado estacionou, talvez por causa da estagnação da minha fé. Ainda precisava tomar água para ingerir alimentos. Fiquei pessimista, pensando que minha fé não fosse além disso. Entretanto, refletindo melhor, percebi que em certo sentido essa doença foi benéfica, pois serviu para medir o grau de desenvolvimento da minha fé. Ela permitiu que eu refletisse sobre minha atitude mental e me aproximasse mais de Deus.

Taniguchi - A doença desta senhora era realmente estranha. Mesmo quando melhorou a ponto de conseguir engolir a comida, ainda precisava tomar dois ou três copos de água fria para descer o alimento que parava na entrada do estômago.

Ando - Ainda no inverno passado, eu tomava água gelada depois de cada bocado e ficava tiritando de frio.

Taniguchi - E não bastava ser líquido para descer; o chá também parava na entrada do estômago e precisava de água fria por cima.

Ando - Entretanto, cerca de quinze dias após vir para cá, já conseguia ingerir alimentos facilmente com chá. O mesmo aconteceu com os doces, e eu já não tinha receio de fazer visitas. Há dias, um parente de Kobe levou-me para almoçar no restaurante do Magazine Daimaru. Fui preocupada, mas correu tudo bem e me senti muito feliz.

Taniguchi - Por que foi curada a doença da sra. Ando, considerada incurável pela medicina? É porque ela compreendeu, pela simples leitura de dois exemplares da revista Seicho-no-Ie, a Verdade divina de que o ser humano pode viver, mesmo sem ingerir alimentos. Esta compreensão é fundamental. Enquanto ela estava preocupada com a alimentação, pensando, "É preciso engolir o alimento de qualquer jeito porque não se pode viver sem comer", o alimento parava no esôfago e, se ela forçasse a ingestão, vomitava tudo. Mas quando compreendeu a Verdade de que "mesmo sem alimento, o homem não morre" e desapareceu o seu temor quanto ao fato de não conseguir ingerir alimentos, este começou a entrar facilmente no estômago.

A seita Ittoen prega a teoria segundo a qual "do nada surge a provisão infinita", explicando que, quando o homem compreende "pode viver sem possuir bem algum", a sua situação econômica melhora, passando a receber as coisas necessárias. A Ittoen vem comprovando isso. A mesma Verdade foi agora comprovada fisiologicamente pela Seicho-No-Ie: mesmo sem ingerir nada, o homem pode viver por si mesmo - esta convicção vem da Verdade de que "o homem é filho de Deus". Compreendendo esta Verdade, as demais coisas surgem naturalmente como REFLEXO da convicção obtida. Então, é natural que, por ter adquirido a convicção de que "o homem é filho de Deus e pode viver sem alimento", a sra. Ando tenha melhorado de repente e recuperado a capacidade de ingerir alimentos.

A jovem senhora que há pouco se retirou daqui é a sra. Eiino, esposa de um professor da Escola Agroflorestal de Morioka. Ela veio com a sra. Ando à Seicho-No-Ie para o seu aprimoramento espiritual. Sofria de tuberculose e estava com o corpo todo inchado. No rosto havia manchas de um roxo-escuro, e o médico havia dito aos familiares que ela não viveria mais que uma semana. Foi então que lhe apresentaram o sr. Katsumi Sato. Apesar da sua atarefada ocupação na caixa econômica, visitou-a todas as noites durante sessenta dias, fizesse frio ou calor, para ler-lhe o livro A Verdade da Vida.

Morikawa - Fui acompanhante da sra. Eino desde essa época. No início, ela tratou o sr. Sato muito friamente. Depois de uns quinze dias, ele perguntouo-lhe: "Como é, deu pra entender que o homem é filho de Deus?". E ela respondeu secamente: "Não". Mas, à medida que o sr. Sato foi prosseguindo a leitura de A Verdade da Vida, ela começou a animar-se e a sorrir, e recuperou rapidamente a saúde.

Sawada - Ah! Então era a respeito dela que o sr. Sato comentou na reunião de Tóquio? Parece que ela estava desesperada porque o médico lhe dissera que havia cavernas grandes nos pulmões. Então, o sr. Sato lhe dissera subitamente em tom energético "Que importa que fique sem pulmões?!", arrependendo-se logo em seguida por ter dito algo tão grave. Entretanto, essa frase teria dado grande força à paciente. O próprio sr. sato disse que pareciam palavras vindas de Deus.

Taniguchi - "Pode-se viver, mesmo sem pulmões." - estas palavras, ditas categoricamente pelo sr. Sato, são realmente valiosas. Não é interessante que, justamente por causas dessas palavras, regeneraram-se os pulmões que estavam lesados? Enquanto a paciente se preocupava com a perda dos pulmões e com a transmissão de sua doença, prendendo-se a conhecimentos superficiais de fisiologia e higiene, os seus pulmões se arruinavam. Entretanto, quando ela compreendeu que "pode-se viver mesmo não tendo pulmões" e desapareceu por completo a sua preocupação com os pulmões, estes se regeneraram, surpreendendo a lógica humana. O homem pode viver, mesmo sem alimentar-se, mesmo sem ter pulmões e mesmo sem possuir nada, porque ele não é feito de alimentos, nem de pulmões e sim pela mente. Compreendendo esta verdade e serenando a mente, o alimento passa a ser aceito e os pulmões se regeneram, como reflexo da mente serena. Diante desses casos verídicos, convencemo-nos de que o corpo é realmente reflexo da mente.


(Do livro "A Verdade da Vida, vol.04", pgs. 203 à 211)


quinta-feira, março 25, 2010

História verídica dos que transcenderam a morte - 02

Masaharu Taniguchi


Niino - Gostaria de levantar uma questão. Um casal sem filho, conhecido nosso, adotou uma jovem muito inteligente, com o curso colegial completo, e colocou-a numa faculdade de medicina. Essa moça, bondosa e sincera, tratava os pais adotivos como se fossem os pais verdadeiros, e comportava-se de modo descontraído, espontâneo e livre. Os pais adotivos, no entanto, julgando-a uma ingrata que não sabia reconhecer os favores recebidos, viviam dizendo que talvez não valesse a penas dispensar tantos cuidados, pois não sabiam se seria recompensados. Então aconselhei-os várias vezes a não fazer tal comentário, porque isso poderia se concretizar pelo poder da palavra. Eles não me ouviram. O relacionamento entre eles e a filha adotiva foi-se deteriorando, e finalmente foi desfeita a adoção. A jovem foi rejeitada porque se comportou de de maneira espontânea e livre, tratando os pais adotivos como se fossem pais verdadeiros, sem adulação. De quem seria a culpa?

Taniguchi - Como a senhora mesma disse, isso aconteceu pelo poder da palavra. Se eles diziam aquelas palavras, é porque tinham a presunção de estar fazendo um favor e pretendiam recompensa e gratidão, o que exercia uma pressão invisível sobre a jovem. E esta, que se comportava com espontaneidade, foi-se distanciando, até que veio o rompimento. Se exigirmos retribuição de algum benefício, receberemos ingratidão. Ao contrário, se nada exigirmos, o beneficiado jamais se esquecerá de nós. Mesmo que se esqueça, a recompensa virá oportunamente por meio de outro integrante do todo, pois, ao beneficiarmos um indivíduo, beneficiamos o todo. Se acumularmos virtudes no céu, a provisão virá do celeiro celeste segundo as necessidades. O importante é não esquecermos que um integrante do todo serve ao todo, em vez de pensarmos: "Eu é que beneficio o outro". O homem tende a tornar-se infeliz quando faz distinção demasiada entre o "eu" e o "outro" e perde a noção do todo.

Niino - Esse casal adotou a moça e a fez estudar para garantir sua velhice. Por isso ambos diziam que uma moça que não demonstrava gratidão como ela poderia abandoná-los logo depois de formada.

Taniguchi - Se alguém custear os estudos como se depositasse dinheiro numa cardeneta de poupança e ficar cobrando favores e reconhecimento, não há quem suporte. Talvez pense que é mais valioso investir no ser humano do que no mercado financeiro, pois o primeiro rende "juros" incalculáveis chamados "retribuição" ou "obrigação". Se alguém criar uma filha adotiva com pensamento tão calculista, isso refletirá negativamente na adotada, que então deixará de sentir gratidão. Assim é a lei da mente. Obviamente, é incorreto não sentir gratidão pelos benefícios recebidos. Mas a gratidão só tem valor quando surge espontaneamente da pessoa beneficiada. Beneficiando alguém com idéias interesseiras e exigindo retribuição, esse benefício só servirá para amarrar psicologicamente o beneficiado.

Niino - Há algum tempo, esse casal estava acamado e ambos se queixavam muito, dizendo que a filha adotiva não cuidava deles com a dedicação de uma filha verdadeira.

Taniguchi - Talvez essa jovem não sinta gratidão porque desconhece os sofrimentos da vida. Esse casal adotou a jovem como sua herdeira e pretendia dar-lhe todos os bens que conseguiu através de muitos sacrifícios. Se ela compreendesse que estava recebendo um precioso fruto dos enormer sacrifícios dos pais adotivos, brotaria espontaneamente em seu coração o sentimento de gratidão. Ela provavelmente não sabe o quanto é preciso trabalhar para se adquirir bens porque nunca teve experiência desse tipo. Como lhe faltava essa experiência, Deus devolveu-a ao seu antigo lar humilde para ela vivenciar a severidade da vida e sentir o quanto se labuta para amealhar fortuna, e quanta renúncia e amor são necessários para ceder essa fortnua. Resumindo, o que aconteceu foi a projeção natural da mente do casal e da jovem adotada.

Niino - O senhor tem razão. De fato, a moça não conhece as dificuldades da vida. Além disso, parece ter personalidade forte, pois não se mostra abalada com o que aconteceu. Se eu estivesse no lugar dela e fosse rejeitada em menos de meio ano por "falta de devoção", ficaria extremamente envergonhada perante a sociedade.

Taniguchi - Ela não estava desejando instintivamente voltar para o lar de origem? Mesmo sendo devolvida, não seria maltratada por isso, não é mesmo?

Niino - A mãe verdadeira vivia lhe escrevendo longas cartas, mencionando abertamente: "de sua mãe". Isso também desgostava os pais adotivos.

Taniguchi - Uma vez que entregou a filha em adoção, a mãe deveria evitar tal procedimento. Se a mãe fazia isso sem constrangimento, é porque desejava ter a filha de volta. No consciente, queria confiá-la a alguém que lhe desse condições para estudar, mas intimamente não queria perdê-la. No subsconsciente, desejava que o trato fosse anulado para recuperar a filha. Muitas vezes o subconsciente da pessoa trai o consciente para impor o seu desejo. Analisando uma pessoa que pratica sem nenhum constrangimento algo que contraria o bom sendo e não se dá conta disso, constatamos que existe no fundo do seu subconsciente um sentimento que se rebela contra o consciente.

Ando - Antes de vir para cá, visitei meu filho adotivo e a mulher dele. Percebi que essa minha nora, graças a Deus, tornou-se bastante flexível e compreensiva. Essa mudança deveu-se ao seguinte fato: a empregada dela, de gênio muito forte, usava uma linguagem tão áspera que muitas vezes a assustava e embaraçava. Minha nora disse que essa empregada serviu-lhe de espelho, pois, vendo-se refletida nela, reconheceu seus próprios defeitos. Até então, considerava-se sempre correta e pensava que os outros estivessem sempre errados. Por isso, dizia palavras ásperas e não achava que isso fosse errado. Achava que os outros a tratavam mal, sem que ela tivesse feito algo errado. Como a empregada tinha um temperamento semelhante ao seu, pela primeira vez percebeu seus erros e compreendeu que precisava se corrigir. Assim ela me confessou com muita humildade.

Taniguchi - Isso é muito bonito. Se a pessoa for somente correta, sem ter um coração grande e magnânimo, capaz de evolver com amor a tudo e a todos, acabará trazendo sofrimento a si própria e aos outros. Quando a pessoa deixar de lado a idéia de que só existe um modo de ver os fatos e que não existe outro melhor que o seu - quando abandonar essa estreiteza mental - somente então ela passará a viver num mundo livre e aberto. Olhando o mundo não somente pela nossa ótica, mas também segundo a visão alheia, compreenderemos o mundo de outras pessoas e veremos que todas têm razão e são perdoáveis. Jesus Cristo comeu e bebeu com coletores de tributos e beberrões porque certamente tinha mente aberta e magnânima.

Quando pensamos que só o nosso modo de ver está correto, parece que todos estão contra nós, o mundo se torna pequeno, dando a impressão de que não há espaço para vivermos, e finalmente ficamos com vontade de morrer. Assim é a maioria dos suicidas. Ao percebermos que existem diversos pontos de vista, compreendemos que tudo deve ser perdoado e estar em harmonia, e não podemos deixar de render graças por isso. Quem inconscientemente agride os outros com suas palavras é aquele que não possui mente tolerante. Não sendo tolerante, profere sem refletir palavras agressivas. E os outros reagem, respondendo agressivamente. Então pensa que eles o odeiam. É isso que muitas vezes desarmoniza o relacionamento conjugal.

Ando - Minha nora tentou o suicídio antes de se casar: dizendo ao médico que não conseguia dormir, pediu-lhe para receitar sonífero e o ingeriu todo de uma só vez. Ficou inconsciente vários dias, causando um grande transtorno aos familiares e aos amigos.

Taniguchi - Quem tenta o suicídio possui mente estreita, é egoísta e persiste obstinadamente na sua opinião. Logo, ou ele quer impor sua opinião ao mundo, ou tenta fugir dele. Aquele que procura impor suas idéias e não acata as idéias dos outros acaba prejudicando a si próprio. O pinto que nunca sai da casca do ovo fatalmente acabará morrendo. O mesmo ocorre com o ser humano. Ele consegue evoluir somente quando rompe a casca do "ego". Ele precisa passar uma vez por um treinamento espiritual para transcender o seu pequeno mundo. A sua nora está agora sendo submetida por Deus a esse treinamento.

Ando - Meu filho me confidenciou que reconhece o próprio defeito, que é fraqueza de caráter. Disse que às vezes tem vontade de morrer, mas que nem isso consegue. Mesmo sabendo que precisa resolver a sua situação atual, pediu-me para esperar mais um pouco. Eu insisti que se separasse da mulher com quem está envolvido, mas parece que não está preparado para isso. "Mamãe, se a senhora vai à Seicho-No-Ie por minha causa, peço que espere mais um pouco", pediu-me. Eu disse a ele: "Não vou só por sua causa; vou principalmente por mim mesma, a fim de alcançar o meu despertar". Professor, existem tantas pessoas infelizes...

Taniguchi - A sua nora já começou a mudar o seu modo de pensar. Antes ela pensava que os outros agiam mal e que só ela era correta, mas agora compreendeu que as pessoas ao seu redor, que pareciam injustas e imperfeitas, eram, na verdade, reflexo de seu próprio pensamento que criticava e feria o próximo. Se ela compreender que a conduta do marido também é reflexo de sua mente, que é ela quem está errada, e abandonar completamente a atitude mental de criticar os outros, não poderá tomar uma atitude tão covarde como a de suicidar. Se ela tomar a resolução de viver pacientemente o quanto for necessário para compensar os erros que cometeu, o coração do marido voltará para ela. A mente que pensa em suicídio para fugir dos sofrimentos ou para se vingar ainda não está verdadeiramente arrependida. A mente que critica e fere o próximo afugenta o próximo. Ficando perto de uma pessoa cuja mente é assim, qualquer um, seja marido ou não, sente-se criticado e afasta-se dela. Porém, se a mulher tornar-se afável e acolhedora, deixando de criticar os outros, será como um ímã e com certeza conseguirá atrair o marido. Mesmo que ele não volte, se ela abandonar a mente criticante e reconhecer, com naturalidade, que o marido se afastou dela com razão, sentir-se-á aliviada e deixará de sofrer.

Cont...

(Do livro "A Verdade da Vida, vol. 04" - pgs. 196 à 203)


terça-feira, março 23, 2010

História verídica dos que transcenderam a morte - 01

Masaharu Taniguchi


*Obs: Assuntos abordados na mesa-redonda realizada em 20/11/1932

Kono – A professora Kamimura estava ansiosa para participar desta reunião, mas telefonou comunicando que não poderá vir devido a um imprevisto de última hora. Ela tem um problema com o marido e já falaram até em divórcio. Ela queria a orientação do senhor, mas achou que não deveria tomar o seu tempo tão precioso e decidiu resolver sozinha o problema. Ela não se contenta em se dedicar apenas aos afazeres de dona de casa. “Para se viver como ser humano e sentir a alegria de viver”, diz ela, “é preciso amar o próximo”. Assim, ela trabalha ativamente como membro da diretoria da entidade assistencial Kibo-sha, do sr. Seiko Goto. O marido considera errado a mulher deixar o lar para se dedicar a uma obra social, e pede que ela seja uma boa dona de casa. Ela o conheceu quando ele ainda sofria com a separação da primeira mulher e, compadecida, casou-se com ele, pensando salvar uma criatura.

Taniguchi – Muitos falam em “salvar o próximo” como se estivessem fazendo uma caridade a um coitado. Com tal atitude mental não se salva ninguém. Essa mentalidade reflete o orgulho de quem se considera superior e despreza o outro, dizendo-lhe em pensamento: “Você é uma pobre criatura que não consegue viver sem a minha ajuda”. Enquanto tiver esse orgulho e esse desprezo, a pessoa não conseguirá salvar o próximo. Na verdade, salvar alguém não é dar-lhe algo, desprezando-o. Salvar alguém é reconhecer a sua natureza divina, respeitá-lo, orar para que se manifeste a natureza divina que está oculta no interior dele e fazer com que desperte nele o seu “verdadeiro Eu” forte e maravilhoso. Esta é a verdadeira salvação.

Segundo a carta que recebi da sra. Katsumi Sato, da Regional de Iwate, reuniram-se no dia 25 de outubro, na residência da sra. Toshiko Sato, em Tóquio, dezoito pessoas da Seicho-No-Ie, entre as quais a sra. Haruki (da Regional de Tóquio), a sra. Sawada (da Regional de Kumamoto) e a sra. Suzuki ( da Regional de Xangai). Nessa reunião, a sra. Suzuki disse que procurava ser “uma pessoa normal e agradável”. Essas palavras calaram fundo no coração da sra. Katsumi Sato e abriram-lhe os olhos, conforme diz na carta. Por que ela se sentiu tocada pelas palavras “uma pessoa normal e agradável”?

Se alguém pensa que precisa fazer algo acima do normal para se valorizar, é porque lhe falta conscientizar a natureza divina do ser humano. O ser humano é valioso porque é filho de Deus por natureza, sem acrescentar nada, sem fazer nada de especial, fora do comum, para se diferenciar dos outros e chamar a atenção. Se alguém não se sente valorizado e não se acalma, é porque não conscientizou que é valioso por natureza, sem precisar acrescentar nada; é porque lhe falta a conscientização de que, sendo filho de Deus e valioso por natureza, não necessita acrescentar artifícios externos. Por isso, pensa impacientemente que precisa fazer algo mais. Pensa que não tem valor se não exibir seu amor mais do que os outros, esquecendo-se, no entanto, de amar as pessoas da sua própria família. Sente grande satisfação, por exemplo, em enviar donativos e víveres a vítimas de calamidades em locais distantes, desprezando as pessoas que estão próximas. E quando não consegue fazê-lo, sente-se desvalorizado. Entretanto, mesmo que não consiga fazer nada de especial, a pessoa deve compreender que o seu valor está na sua natureza divina, que não diminui nem se desgasta. Isto é o mais importante. Mas isso não significa que a pessoa nada deva fazer para salvar o próximo. O que quero dizer é que, se ela não compreende o seu valor, ela própria ainda não está salva. Nas Palavras de Sabedoria da Seicho-No-Ie, existe a frase: “Sê bondoso para contigo mesmo”. Se a própria pessoa não sabe como se salvar, não saberá salvar os outros. Se não souber o que é salvar, não poderá conduzir os outros ao verdadeiro estado de salvação. Um cego que conduz outro cego, com a intenção de salvá-lo, poderá arrastá-lo para o fundo de um rio.

Alguns pensam que salvar o semelhante é arrecadar dinheiro, mantimentos e roupas para os necessitados ou construir sanatórios. Isso também é uma forma de salvar, e muitas vezes é louvável, porém não constitui a verdadeira salvação. Há os que, recebendo ajuda material, sentem o amor das pessoas e se salvam, mas há também os que, justamente por receberem auxílio material, aumentam seu espírito de dependência, tornam-se ociosos e acabam degenerando. Um enorme sanatório que traz na fachada do edifício dizeres atemorizantes, espalha ao seu redor a idéia de doença, o que poderá resultar na multiplicação de doentes em quantidade dezenas de vezes maior que a daqueles que estão tentando curar. Ao invés de salvar por meios materiais, estariam prejudicando-os. A tentativa de salvar por meios materiais tem suas conveniências e inconveniências. Quem vê apenas as conveniências ressalta-as e pensa que está salvando o mundo. Mas a salvação por meios materiais não é salvação eterna. A salvação apenas material está fadada a ter um fim, pois a matéria não se eterniza. Não se pode dizer que uma pessoa foi salva verdadeiramente, se ela não alcançar a salvação que independe da matéria, isto é, a salvação que se baseia na conscientização de que a essência do homem é Deus e, portanto, ele já está salvo sem precisar acrescentar-lhe nada, mesmo que nada possua materialmente.

Talvez alguém possa fazer a seguinte pergunta: “Será que, proporcionando aos que estão passando fome a salvação baseada nessa conscientização, poderemos deixar de alimentá-los materialmente?”. Na verdade, ao compreendermos que “já estamos salvos ainda que não possuamos coisa alguma, porque nossa essência é Deus”, alcançamos o estado espiritual de total liberdade e desprendimento em relação à matéria, e por isso conseguimos doar, sem apego e relutância, bens materiais aos nossos semelhantes; conseguimos natural e espontaneamente, oferecer ajuda aos que dela necessitam, da mesma forma como a água flui livre e naturalmente da parte mais alta para a mais baixa. A Vida é amor e, ao mesmo tempo, força que vivifica. Logo, nós, que na essência somos Vida, passamos a realizar espontaneamente atos de amor, atos que vivifiquem o todo; passamos a produzir bens materiais e a salvar nossos semelhantes, sem nos prendermos à matéria. Em vez de construir um sanatório que espalha a idéia de doença e infunde temor na mente das pessoas, como faz certa entidade religiosa, podemos criar meios que libertem efetivamente as pessoas.

Ao contrário do que se pensa, quando se abandona a preocupação em obter recursos materiais é que estes se tornam abundantes. Justamente por se preocuparem só com coisas materiais é que tanto os indivíduos como os países tornam-se exclusivistas e isolados, e não conseguem se suprir mutuamente, resultando numa situação em que, embora exista produção excedente, a humanidade vive na pobreza, como está acontecendo atualmente. Se o homem abandonar o seu interesse excessivo pelas coisas materiais e passar a valorizar a Vida, a viver como Deus vive, a trabalhar como Deus trabalha e a manifestar a Vida alojada em si e nos outros, os bens materiais aumentarão ao invés de diminuir. Quando se esquece a parte material, esta melhora. Uma mesa, por exemplo: enquanto estivermos com o pensamento e os olhos pregados na mesa, ela não estará cumprindo a sua função; mas, quando estivermos lendo ou escrevendo sobre ela, esquecidos da sua existência, ela estará cumprindo plenamente a sua função. De modo análogo, quando se esquece o lucro egoístico surge a riqueza verdadeira. Obviamente, é errado desprezar a economia e fazer gastos descontrolados que não tenda ao propósito de vivificar e amar o próximo. Entretanto, quando se transcende os lucros e as vantagens, sem obstruir o fluxo natural da Vida (a ação de amar), as posses materiais, paradoxalmente, tornam-se abundantes. O mesmo se dá com o corpo carnal: quando se esquece o corpo é que vem a saúde e aumenta o vigor. Compreendendo-se claramente que se alcança a salvação sem mesmo possuir coisas materiais, consegue-se até auxiliar materialmente os necessitados, pois torna-se possível repartir o que se produz, sem apego, com total desprendimento.

Não podemos julgar a atitude da sra. Kamimura sem conhecermos a complexidade de sua situação e seus motivos. Porém, falando de modo genérico, não é natural alguém pensar que encontra razão de viver apenas salvando grande número de pessoas ou somente atuando nas obras sociais. Sem dúvida, é importante salvar muitas pessoas ou realizar trabalhos de assistência social, porém é igualmente importante salvar um só indivíduo. E mesmo para salvar um único indivíduo, se a pessoa se apegar ao seu “eu”, dizendo “Eu vou salvar Fulano”, colocando o “eu” em evidência, irá humilhar e rebaixar o outro, que então poderá retrucar: “Se faz tanta questão de exibir o favor que faz, não preciso que me salve”. Por isso, a pessoa deve compreender que quem salva não é o “eu” que pensa “Eu sou salvá-lo”, mas sim as grandiosas mãos salvadora de Deus que agem através dela, e sentir-se grata por isso. Do contrário, longe de salvar os outros, não salva nem a si própria, pois, pensando que o outro não está reconhecendo a caridade que ela lhe está prestando, irrita-se e fica com a mente agitada, e esse estado impede a sua própria salvação. Por isso, o “eu que pretende salvar os outros” precisa deixar-se envolver pelas grandiosas mãos salvadoras e dissolver-se nelas. Do contrário, a pessoa se torturará por não conseguir superar o próprio conflito interno, ou seja, por não conseguir a sua própria salvação, embora esteja trabalhando para salvar os outros. Se o amor não for desprendido, não poderá haver salvação verdadeira. O amor-apego não leva à salvação verdadeira. E o “amor-apego” não se refere apenas ao sentimento de alguém que se apega a uma pessoa; é “amor-apego” também o amor daquele que se apega a muitas pessoas, a questão de uma comunidade ou de uma classe social. Quando a pessoa anular o seu “pequeno eu”, fundir-se com a grandiosa força salvadora de Deus e passar a agir naturalmente, sem nada forçar, então conseguirá a sua salvação e, a partir de então, poderá salvar os outros em grande número. Se surgem tormentos, é porque a pessoa “força” o pensamento: “Eu vou salvar muitas pessoas”. Se, após compreender que é Deus que salva, a pessoa se sentir impelida pela força de Deus a trabalhar em obras sociais fora de casa, poderá fazê-lo e salvar muitas pessoas. Quando não puder fazê-lo por desígnio divino, deverá compreender que Deus não age unicamente através dela e que existem inúmeras outras pessoas que trabalham como mãos de Deus, as quais se encarregarão dos trabalhos de âmbito social para salvar em massa os necessitados.

Tendo esta compreensão, uma mulher poderá ficar tranqüila, mesmo que por alguma razão não possa atuar socialmente; o fato de ficar em casa e iluminar seu lar tornar-se-á motivo para se alegrar e agradecer. Salvar muitas pessoas é importante, mas salvar uma pessoa também o é. Tanto nas escrituras budistas como na Bíblia lemos que a salvação de um filho pródigo causa a Deus mais alegria do que muitos filhos exemplares que estão a salvo. Iluminar o lar e fazer dele um modelo de lar verdadeiramente feliz é uma obra maior do que desenvolver, brigando com o marido, trabalhos para o bem da coletividade. Tais obras são louváveis, mas a pessoa precisa ter os pés firmes no chão para vivificar ao mesmo tempo o lar e a coletividade.

Certa ocasião, conversando com as líderes da Tomo-no-Kai (Associação de Amigas) de Tóquio que esteve aqui, soube que a sra. Motoko Hani, também líder daquela entidade, declarou guerra contra o velho costume de mulheres japonesas viverem trancadas dentro de casa, muitas delas ociosas, desperdiçando o tempo sem fazer nada além de ler revistas e romances. Parece que é um movimento para racionalizar a vida, destinando essas horas vagas para estudos culturais e atividades de assistência social. É uma idéia com a qual a Seicho-No-Ie também está de pleno acordo. Convém lembrar, no entanto, que existem muitas donas de casa tão atarefadas com os fazeres domésticos que não lhes sobra nenhum tempo vago. Por mais que tentem racionalizar a vida no lar, elas não têm possibilidade de se dedicar a outras atividades. Por isso, pessoas como a sra. Mumeo Oku comentam que tais atividades são desenvolvidas por senhoras da classe mais favorecida, que têm tempo disponível, e o resultado disso não vai beneficiar o povo em geral. De qualquer modo, no caso de senhoras de classe menos favorecida que abandonam os afazeres do lar, que são muitos, para se dedicarem exclusivamente a atividades sociais, é compreensível a reação de seus maridos, que clamam pela volta da mulher ao lar.

Conheço uma senhora cristã que vive atarefada com trabalhos ora da igreja, ora de uma associação feminina, ora de uma associação de caridade, e não dá atenção aos próprios filhos. Às vezes, os filhos voltam da escola e precisam aguardá-la por horas e horas em frente ao portão trancado de sua casa. Este é um caso extremo. Porém, se uma mulher acha que sua vida não tem sentido caso não realize obras sociais ou que não tem graça viver como dona de casa, e não sente razão de viver a não ser através de uma atividade extraordinária que atraia a atenção dos outros, devemos dizer que ela está perseguindo a glória aparente e que sua vida não é algo natural que brota da consciência de que o ser humano é valioso por natureza por ser filho de Deus. É preciso compreender que uma vida singela como a do orvalho, que durante a noite vem despercebidamente umedecer as plantas e desaparece quando chega o dia, é tão valiosa quanto a realização de obras vistosas. O importante é a mulher viver com profundidade e autenticidade, esteja ela dentro ou fora de casa. O que não está correto é viver superficialmente, mantendo apenas as aparências. É incorreto viver ociosamente dentro de casa, como também é incorreto atuar irrefletidamente fora de casa, desprezando o lar, achando que “as atividades externas, voltadas para obras sociais, são mais atraentes e interessantes e satisfazem facilmente o desejo de agir como altruístas”.

Seja para se expandir profissionalmente, seja para permanecer no lar, a mulher precisa viver com profundidade e autenticidade, dando cada passo com firmeza. Este é o modo de viver da Seicho-No-Ie, totalmente livre, que não se prende às formas nem cria um padrão único para todas as pessoas. Não é um modo de vida incômodo em que a pessoa se sinta mal caso não se enquadre num molde fixado por ela. É fácil o antigo conceito (molde) de que a mulher só deve cuidar do filho, como também é falso dizer que só se encontra a razão de viver nas atividades fora de casa.

A Vida deve ser livre: o velho molde de dona de casa deve ser rompido, mas a pessoa não deve colocar-se dentro de um novo molde, ou estará de novo aprisionada. Quando se encaixa num molde, a Vida começa a se sufocar, resultando em sofrimento. Sendo a criatividade um atributo da Vida, basta que cada pessoa viva com profundidade e autenticidade, de acordo com a situação. Quando a mulher revelar sua criatividade no lar como excelente dona de casa, ela não será uma dona de casa estereotipada. E quando ela revelar sua criatividade nos trabalhos profissionais, não será uma “profissional estereotipada”. Não será nem dona de casa, nem profissional; será apenas um ser humano que vive com profundidade e autenticidade, seja no lar, seja na coletividade. Ter uma vida significativa, vivendo naturalmente como ser humano – este é o modo de viver da Seicho-No-Ie. Quando se coloca em prática este modo de viver, deixa de existir conflito entre a vida doméstica e a vida comunitária.

Na vida doméstica de até agora, a mulher se prendia muito a um só lar, o dela, razão pela qual ou precisava afastar-se do lar para servir à sociedade, ou, para cuidar do lar, precisava afastar-se da sociedade. Mas o lar da nova era deve fazer parte da sociedade como uma de suas células, de tal forma que a melhora de um lar sirva para a melhora global da sociedade, e que o desenvolvimento desta alivie o lar ao invés de sacrificá-lo.

Recentemente, recebi a visita da sra. Tsuneko Matsumoto, também líder da Tomo-no-Kai (Associação de Amigas) de Tóquio. Ela está planejando criar uma espécie de jardim-escola, onde pretende cuidar de crianças e educá-las dentro dos princípios da Tomo-no-Kai e da Seicho-No-Ie. E já até existe uma pessoa disposta a doar o terreno e o prédio. “Na maioria dos lares, a mãe fica o dia inteiro cuidando de uma ou duas crianças, e não sobra tempo para fazer os serviços domésticos a contento, nem para cuidar de seu aprimoramento espiritual, nem para auxiliar o marido. Se essas crianças fossem reunidas num jardim-escola sob os cuidados das mães que se revezariam na função de educá-las segundo um elevado princípio moral, as mães não escaladas terão algumas horas livres. Com isso, elas poderão realizar melhor as tarefas domésticas, aplicar-se em seu aprimoramento espiritual, estudar puericultura, auxiliar o marido, etc. As mães que até agora cuidavam aleatoriamente de seus filhos, desperdiçando muito tempo inclusive na educação deles, poderão criá-los melhor, despendendo menos tempo. As crianças, vivendo em grupo desde a tenra idade, desenvolvem a cooperatividade, o sentido de equipe, a harmonização com o todo, diminuindo a tendência individualista e egoísta”. Assim explicou ela o seu plano.

Uma obra social dessa natureza é diferente de um movimento em que as mulheres procuram se expandir somente fora do lar, menosprezando suas ocupações domésticas. É uma obra através da qual os lares, até então isolados, se desenvolvem e se comunicam socialmente, e o fato de a mulher atuar socialmente não irá tirar a alegria do lar; pelo contrário, eliminará alguns afazeres e o desperdício de tempo, e aumentará as horas para a família conviver com mais alegria e conforto. Assim, o marido já não terá motivo para condenar as atividades da esposa fora de casa.

Quanto aos trabalhos dos grupos femininos de assistência social, o ideal seria que as senhoras atuassem, não no sentido de disputar emprego com os profissionais da área, mas no sentido de reduzir a quantidade e melhorar a qualidade dos trabalhos domésticos, e que, com esse tempo economizado, tornasse automaticamente possível a elas atuarem como voluntárias nas obras sociais.

Uma senhora consome muito tempo, por exemplo, levando frequentemente seus filhos ao médico. Logo, conhecer a Verdade que a Seicho-No-Ie prega e fazer com que ninguém na família adoeça é o fator mais importante para racionalizar o tempo das donas de casa.

Kono – Muito instrutiva a sua explicação.
Cont...


(Do livro “A Verdade da Vida, vol. 04"; pgs. 183 à 196)


sábado, março 20, 2010

O ponto de vista para se ler o Gita - (fim)


Núcleo


O Gita, uma das mais respeitadas Sagradas Escrituras do Oriente, pertence a uma outra tradição e contexto espiritual. Mas, se você se permitir, verá que este texto universal te revelará o mesmo Cristo, não o Cristo a quem suplicamos que nos proteja, mas a quem agradecemos pela proteção e pela própria Vida que nos proporciona todos os dias de nossas vidas.

Neste sentido o texto que se segue é uma revelação. Uma revelação divina! As verdadeiras revelações não procedem dos pensamentos, da mente humana. Esta é uma grande dificuldade! As verdadeiras revelações surgem de percepções. Nem sempre a razão é capaz de apreender o real sentido de uma "percepção".

Pensamentos são produtos da mente; as percepções provêm da Consciência. O que o Maharaj está propondo é uma percepção, não um pensamento, esta é a barreira mental a ser transposta. O ponto de vista da Consciência desperta – a Consciência de Krishna – é o ponto de vista da Consciência do Ser, que Vive em nós, que é nossa Vida e real identidade, mas que, mesmo assim, não sabemos.

O problema está em que desconhecemos nossa real identidade. A mente é a máscara que vela a real identidade: A mente vela o Ser; a consciência O desvela. Assim, quando utilizamos a mente para descobrir quem somos, esta descoberta se torna um objetivo impossível. O pensamento, o raciocínio e a lógica humana são instrumentos inadequados para o fim de sabermos nossa real identidade. A nossa mente está condicionada por suas muitas crenças e pela própria forma com que percebe a realidade. Ela percebe de forma dual. Onde há apenas um Ser e Suas infinitas manifestações, a mente “percebe” muitos seres, todos individualizados... Ela percebe as formas, mas não a essência que existe em todas as formas.

Para se ler o Gita do ponto de vista de Krishna é necessário descartarmos a “máscara" da personalidade, e não presumirmos que somos nem mesmos “os Arjunas do mundo”. Tampouco devemos presumir que somos“o Krishna”, que no Gita é o Ser Real, a essência de todos os nomes e formas, a própria divindade.

Perceba esta sutileza: O Maharaj nos sugere que devemos adotar o ponto de vista de Krishna, e não que devemos nos identificar como sendo um personagem do Gita: o Krishna. Esta é uma revelação que nos virá como uma percepção, talvez ao longo da leitura do Gita, ao final, ou mesmo até algum tempo após. Não importa o tempo em que a percepção ocorrerá. Saiba apenas que é possível, embora não pareça evidente. Assuma o ponto de vista de Krishna e perceberá que o Gita está desvelando a Consciência que, no Gita, é representada por Krishna, a essência e real identidade de todos os seres. Se isto for feito, afirma o Maharaj: “Vocês entenderão, então, que no Vishva-rupa-darshan, o que o Senhor Krishna mostrou a Arjuna não era seu próprio Svarupa, mas o Svarupa – a verdadeira identidade – do próprio Arjuna e, por conseguinte, de todos os leitores do Gita".

Note que, no Gita, Arjuna representa “um ser humano bom”, que quer ouvir e seguir as orientações do Senhor. Mesmo assim, a percepção de Arjuna é mental. Onde há apenas um ele vê muitos. Então ele perde as forças e lamenta que “não pode lutar”. Percebendo as limitações da mente humana de Arjuna – seus conceitos e crenças equivocadas, ainda que, do ponto de vista humano, louváveis, dignas de respeito pelos demais seres humanos, até por seus oponentes –, Krishna sabe que esta visão mental e valores equivocados não livrará Arjuna da derrota.

Não somente “a mente de Arjuna” o ilude, mas também a mente iludirá a qualquer um que a tomar como ponto de partida e instrumento para “perceber” a verdade.

Para estarmos "iluminados pela Consciência", precisamos nos sintonizar com a Consciência do Ser - a “percepção consciencial” -, que no Gita se revela plenamente pela visão de Krishna e suas revelações, que é o ponto de vista sugerido para se ler o Gita, o qual transcende a percepção da mente de Arjuna, que é uma visão apenas humana e “mental”.

Na Bíblia conhecemos a ordem divina para nos “erguermos de entre os mortos”, ou seja, de nossas “visões mentais” da vida. Só então Cristo, a Consciência do Ser, nos iluminará, virá e nos dará vida, pois Cristo é a própria Vida que vive em nós.

Como advertência antes da leitura do texto, esteja atento e não presuma! Assuma o ponto de vista de Krishna para ler o Gita, mas não presuma nada. Presumir é fruto da mente, que ilude. Não presuma que você é o Krishna, assim também como não devemos presumir que somos “um com Deus”. Isto vem no tempo de Deus, como uma revelação, uma percepção. Você não precisará "acreditar", como também saberá que "não acreditar" não altera esta realidade... O acreditar ou não acreditar estão no nível da mente, e não na Consciência. Os que sabem que é possível, por exemplo, colocar um ovo em pé equilibrado, sem truques, não precisam acreditar. Os que não acreditam que isto seja possível não alteram a realidade de que isto não apenas é possível, mas que qualquer pessoa pode fazer isto. Da mesma forma qualquer pessoa pode “conhecer a verdade”, mas será preciso desfazer todos os condicionamentos e as crenças que tem a respeito do que é a Verdade. O conhecimento da Verdade liberta o homem. A "verdade a ser percebida" é que Deus, o Ser que Vive em nós, é a própria Verdade. Este Ser Real vive em todos os seres. Nenhum ser tem vida em si mesmo, e nem está separado do Ser - o único Ser. No ser humano, este Ser Se revela como Consciência, não como a “sua” ou a “minha” consciência, mas como a Consciência do Ser, Aquilo que “Eu Sou”, e que é impessoal, universal. Revelando sua real identidade, Cristo diz: “Antes que Abraão existisse, Eu Sou.” O Cristo que vive de eternidade a eternidade é real e onipresente. Está em todos, aguardando apenas o momento em que será “percebido”.

Leia o Gita do ponto de vista de Krishna, e em algum ponto esta “percepção” sobrevirá e revelará a real identidade, não apenas de Krishna ou de Arjuna, mas, também, a de Cristo, a sua, a minha e a real identidade de todos os seres.


Svarupa - a forma cósmica, a verdadeira identidade/face de Krishna revelada.

quinta-feira, março 18, 2010

O ponto de vista para se ler o Gita - 01

Introdução: O texto a seguir que estará diante de você provém de outra tradição e contexto espiritual, o Gita, uma das mais respeitadas Sagradas Escrituras do oriente. Há um segredo em cada Escritura Sagrada - um segredo que, se for notado, garantirá o seu envolvimento, afinamento e compreensão dos textos sagrados em sua máxima profundidade. Todo conteúdo encontrado dentro de um livro sagrado não diz respeito a outra coisa senão a Deus, ao conhecimento da Verdade, à Consciência ou a Unidade. Só há uma Verdade e a característica da Verdade é ser UNIVERSAL; a Consciência é Una com tudo o que existe. E a Consciência carrega o Infinito dentro de si! É impossível algo estar existindo - algo ser! - e não estar em Unidade com a Consciência ou a Verdade. Você vive - esse fato por si só prova que você está na Unidade e é uno com tudo aquilo que está na Unidade com a Consciência, Deus. O Segredo é: saber/compreender que tudo o que as Escrituras Sagradas relatam são Verdades, são histórias concernentes a cada um de nós. O Gita narra o diálogo acontecido entre os personagens históricos "Krishna" e "Arjuna", porém todas as coisas nele contidas são simbologias, um reflexo externo de nossa própria história. Uma Escritura Sagrada não deve ser encarada apenas a partir de um contexto histórico, como se a Verdade ou as experiências vividas pelos personagens pertencessem a eles exclusivamente. Não! A história de Krishna é a minha própria história; a história de Jesus é a minha e a sua história. A Bíblia e o Gita não são livros, são espelhos. Há uma só Consciência sendo! A mesma Consciência que no passado apareceu como Krishna, está aparecendo como eu e você. Eis porque tudo o que está contido no Gita, sobretudo o que diz respeito a Krishna, é verdadeiro para você e para mim. No Gita, Krishna ensina ao Arjuna: "O Ser Divino que sou, você também o é! Não veja-se separado ou excluído de Mim, senão você estará preso na ilusão. Perceba que minha Consciência Divina é também a sua". Krishna pede a Arjuna que deixe de lado a visão mental/dual, troque/inverta o referencial e perceba de forma direta quem ele é.

Neste texto, Nisargadatta Maharaj, por saber que não há outra forma ser a Verdade senão sendo a própria Verdade, pede que comecemos a ler o Gita do ponto de vista de Krishna ao invés do de Arjuna. Tanto o Gita como a Bíblia - assim como todas as escrituras sagradas - têm sido lidos pelas pessoas como se elas fossem buscadoras da Verdade que tentam, que desejam, que se esforçam e fazem de tudo (esforços pessoais) para compreender a Verdade e finalmente um dia realizá-La em si mesmas. Isso é impossivel; ninguém pode ser a Verdade se já não for a própria Verdade. Se uma pessoa não for a Verdade é impossível que um dia ela deixe a condição de "não ser a Verdade" e adentre a condição de "Ser a Verdade". É por isso que Nisargadatta diz: "Não leiam o Gita do ponto de vista do aspirante à Verdade. Leiam-no do ponto de vista de Krishna, da própria Verdade - você já é a Verdade; eis o motivo". O Gita não tem de ser um livro no qual sua mente trabalhe com diversas possibilidades ou passeie viajando/divagando em hipóteses fantasiosas, como: "vou ler o Gita para conseguir (no futuro) encontrar Deus, compreender a Verdade". Como espelho, as coisas que existiam só como possibilidades, o Gita torna-as concretas; aquelas hipóteses ou fantasias deixam de ser hipotéticas ou fantasiosas e são vistas como verdadeiras no exato momento presente. Tudo está ali! - Essa é a percepção a ser notada. A mente não necessita ir a lugar algum, ela deve ficar.

O Segredo de conhecer a Verdade está na Unidade - como em tudo há o UM se expressando, a Verdade válida para uma de Suas manifestações é também verdade para todas as outras. Que valor teria a Bíblia ou o Gita para mim, se tudo o que é encontrado neles não possuir relação alguma com o ser que sou? Se a verdade da Bíblia ou do Gita concernissem somente a um homem chamado Jesus ou a um de nome Krishna, então a Bíblia ou o Gita seria o livro deles somente. E, além de para Jesus e Krishna, tais escritos não teriam nenhuma razão de ser, pois, por mais que as escrituras alcançassem outros seres, nenhuma possibilidade de transformação ou de realização a eles jamais seria possível. Toda e qualquer busca do homem é por coisas que apontem e digam respeito ao próprio ser que ele é.

Por ora, ficaremos com este texto de Nisargadatta Maharaj. E a seguir, no próximo post, será feita uma explanação mais específica, aprofundando, com maiores detalhes, os assuntos discutidos neste texto do Maharaj.




"Em uma das sessões, uma distinta dama que visitava Maharaj fez uma pergunta sobre o Bhagavad Gita. Enquanto ela formulava sua questão nas palavras adequadas, Maharaj, repentinamente, perguntou-lhe: “De que ponto de vista você lê o Gita?”

Visitante: Do ponto de vista de que o Gita é, talvez, o guia mais importante para o buscador espiritual.

Maharaj: Por que esta resposta absurda? Certamente, ele é um guia muito importante para o buscador espiritual; não é um livro de ficção. Minha pergunta é: Qual o ponto de vista do qual você lê o livro?

Outro visitante: Senhor, eu o li como um dos Arjunas no mundo, para cujo benefício o Senhor foi generoso o bastante para expor o Gita.

Quando Maharaj buscou em torno uma outra resposta, houve apenas um murmúrio geral de confirmação desta.

Maharaj: Por que não ler o Gita do ponto de vista do Senhor Krishna?

Esta sugestão suscitou dois tipos simultâneos de reação de assombro de dois visitantes. Uma das reações foi uma exclamação escandalizada que claramente significava que a sugestão era equivalente a um sacrilégio. A outra foi de um único e rápido bater palmas, uma ação reflexa, obviamente, indicando alguma coisa como o "Eureka" de Arquimedes. Ambos os visitantes interessados estavam como que embaraçados por suas reações inconscientes e pelo fato de que as duas eram o exato oposto uma da outra. Maharaj deu um rápido olhar de aprovação ao que havia batido palmas e continuou:

Maharaj: Muitos livros religiosos se supõe ser a palavra de alguma pessoa iluminada. Por mais iluminada que seja uma pessoa, ela deve falar a partir de certos conceitos que achou aceitáveis. Mas a extraordinária distinção do Gita é que o Senhor Krishna falou do ponto de vista de que ele é a fonte de toda a manifestação, isto é, não do ponto de vista de um fenômeno, mas do númeno, do ponto de vista de que ‘a manifestação total sou eu mesmo’. Esta é a exclusividade do Gita.

Agora, disse Maharaj, considerem o que deve ter acontecido antes que qualquer texto religioso antigo tenha sido escrito. Em todos os casos, a pessoa iluminada deve ter tido pensamentos, os quais colocou em palavras, e as palavras usadas podem não ter sido muito adequadas para comunicar seus pensamentos exatos. As palavras do mestre poderiam ter sido ouvidas pela pessoa que as escreveu, e o que ela escreveu, certamente, seria de acordo com seu próprio entendimento e interpretação. Depois deste primeiro registro manuscrito, várias cópias dele teriam sido feitas por diversas pessoas e tais cópias conteriam numerosos erros. Em outras palavras, o que o leitor de qualquer tempo particular lê, e tenta assimilar, pode ser totalmente diferente do que realmente o mestre original pretendeu comunicar. Acrescentem a tudo isto as interpolações inconscientes, ou deliberadas, feitas por vários eruditos no curso dos séculos, e vocês entenderão o problema que eu estou tentando comunicar a vocês.

Disseram-me que o próprio Buda falou apenas na linguagem Maghadi, enquanto seu ensinamento, como foi anotado, está em Pali ou em Sânscrito, o que poderia ter sido feito apenas muitos anos mais tarde; o que agora temos de seus ensinamentos passou por numerosas mãos. Imaginem o número de alterações e acréscimos que foram infiltradas nele por um longo período. Não seria surpreendente que haja agora diferenças de opinião e disputas sobre o que Buda realmente disse, ou quis dizer?

Nestas circunstâncias, quando peço a vocês que leiam o Gita do ponto de vista do Senhor Krishna, peço que abandonem imediatamente a identidade com o complexo corpo-mente quando o lerem. Peço que leiam de acordo com o ponto de vista de que vocês são a consciência desperta – a consciência de Krishna – e não os objetos fenomênicos aos quais ela deu sensibilidade – para que o conhecimento que está no Gita seja verdadeiramente revelado para vocês. Vocês entenderão, então, que no Vishva-rupa-darshan, o que o Senhor Krishna mostrou a Arjuna não era seu próprio Svarupa, mas o Svarupa (a verdadeira identidade) do próprio Arjuna e, por conseguinte, de TODOS OS LEITORES do Gita.

Em resumo, leiam o Gita do ponto de vista do Senhor Krishna, como a consciência de Krishna; vocês então compreenderão que o fenômeno não pode ser ‘liberado’ porque ele não tem nenhuma existência independente; é apenas uma ilusão, uma sombra. Se o Gita for lido neste espírito, a consciência, a qual tem se identificado erradamente com o complexo corpo-mente, tornar-se-á consciente de sua verdadeira natureza e se fundirá com sua origem."
Cont...


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*Diálogos de Nisargadatta Maharaj extraídos do do site Editora Advaita

segunda-feira, março 15, 2010

A natureza de Deus


Ramana Maharshi


Pergunta: Deus é descrito como manifesto e não-manifesto. No primeiro caso Ele é dito incluir o mundo como parte de Seu Ser. Se for assim, nós como parte deste mundo, deveríamos facilmente tê-Lo conhecido na forma manifesta.

Bhagavan: Conheça a si mesmo antes de procurar decidir sobre a natureza de Deus e do mundo.

Pergunta: Conhecer a mim mesmo implica em conhecer a Deus?

Bhagavan: Sim, Deus está dentro de você.

Pergunta: Então, o que se coloca no meu caminho de conhecer a mim mesmo ou conhecer Deus?

Bhagavan: Sua mente errante e seus modos pervertidos.

Pergunta: Deus é pessoal?

Bhagavan: Sim, ele é sempre a primeira pessoa, o Eu, permanecendo sempre diante de você. Por você dar precedência às coisas mundanas, Deus parece ter recedido para o pano de fundo. Se você abandonar tudo e buscar Ele apenas, Ele apenas irá permanecer como o 'Eu', o Ser.

Pergunta: Deus está separado do Ser?

Bhagavan: O Ser é Deus, o “eu sou” é Deus. Essas perguntas surgem porque você está se segurando ao ser-ego. Elas não surgirão se você segurar-se no verdadeiro Ser. Pois o Ser real não irá perguntar e nem pode perguntar o que é absurdo. Somente Deus, que parece ser não-existente, verdadeiramente existe, enquanto que o indivíduo, que parece estar existindo, é sempre não-existente. Os sábios dizem que o estado no qual a pessoa conhece sua própria não-existência (sunya) apenas é o glorioso conhecimento supremo.

Agora você pensa que você é um indivíduo, que existe o universo e que Deus está além do cosmos. Portanto, há a idéia do sentido de separação. Essa idéia deve ir. Pois Deus não está separado de você ou do cosmos. O Gita também diz:


"O Ser sou Eu, ó Deus do sono,
Alojado no coração de cada criatura.
Sou o alvorecer e o meio-dia de toda forma,
Também sou seu destino final."

(Bhagavad Gita, X – 20)


Portanto, Deus não apenas está no coração de todos, ele é o suporte de todos, a fonte de todos, a morada e o fim de todos. Tudo procedeu Dele, tem sua estada dele, e finalmente se resolve Nele. Portanto, Ele não está separado.

Pergunta: Como devemos entender esta passagem do Gita: 'Todo este Cosmos forma uma partícula de mim”?

Bhagavan: Isso não significa que uma pequena partícula de Deus se separa Dele e forma o universo. Seu poder (Shakti) está agindo. Como resultado de uma fase dessa atividade o cosmos tornou-se manifesto. Similarmente, a afirmação no Purusha Sukta, 'Todos os seres formam um pé Dele', não significa que Brahman está dividido em várias partes.

Pergunta: Entendo, Brahman certamente não é divisível.

Bhagavan: Portanto, o fato é que Brahman é tudo e permanece indivisível. Está sempre realizado mas o homem não está ciente disso. Ele deve chegar a saber disso. Conhecimento significa vencer os obstáculos que obstruem a revelação da eterna verdade que o Ser é o mesmo que Brahman. Os obstáculos tomados juntos formam a sua idéia de separatividade como um indivíduo.

Pergunta: Deus é o mesmo que o Ser?

Bhagavan: O Ser é conhecido por todo mundo, mas não claramente. Você sempre existe. A existência é o Ser. O “eu sou” é o nome de Deus. De todas as definições de Deus , nenhuma, de fato, é tão bem colocada quanto a afirmação Bíblica “Eu sou aquele Eu sou” no Êxodo 3. Existem outras afirmações, como no Brahmaivaham (Brahman sou Eu), Aham Brahmasmi (Eu sou Brahman) e soham (Eu sou Ele). Mas nenhuma é tão direta como o nome de Jeová que significa “eu sou”. O Ser absoluto é o que é. Ele é o Ser. É Deus. Ao conhecer o Ser, Deus é conhecido. De fato, Deus não é nada além do que o Ser.

Pergunta: Deus é conhecido por muitos nomes diferentes. Algum deles é justificado?

Bhagavan: Dentre os milhares de nomes de Deus, nenhum nome se adequa a Deus - o qual reside no Coração, desprovido de pensamento - tão verdadeira e lindamente quanto o nome “Eu” ou “eu sou”. De todos os nomes conhecidos de Deus, o nome de Deus “eu” - “eu” apenas ressoará triunfante quando o ego for destruído, emergindo como a suprema palavra silenciosa (mouna-para-vak) no espaço do Coração daqueles cuja atenção está direcionada para a tutela do Ser. Mesmo se a pessoa meditar incessantemente no nome “eu-eu” com sua atenção no sentimento “eu”, isso levará a pessoa e a submergirá na fonte da qual o pensamento surge, destruindo o ego, o embrião, que está unido ao corpo.

Pergunta: Qual é a relação entre Deus e o mundo? Ele é o criador ou o sustentador dele?

Bhagavan: Os seres sencientes ou não sencientes de todos os tipos estão realizando ações/atividades apenas pela mera presença do sol, que nasce no céu sem nenhuma volição. Similarmente, todas as ações são feitas pelo Senhor sem nenhuma volição ou desejo da parte Dele. Na mera presença do sol, as magníficas lentes emitem fogo, a flor de lótus desabrocha, a flor-de-lis se fecha e todas as incontáveis criaturas realizam ações e descansam.

A ordem da grande multidão de mundos é mantida pela mera presença de Deus da mesma maneira que a agulha se move diante de um imã, e a selenite emite água, a flor-de-lis desabrocha, e o lótus se fecha diante da lua.

Na mera presença de Deus, que não tem a mínima volição, os seres vivos, que estão engajados em inúmeras atividades, após embarcarem em muitos caminhos para os quais são atraídos de acordo com o curso determinado por seus próprios karmas, finalmente realizam a FUTILIDADE da ação, voltam-se para o Ser e atingem a liberação.

As ações dos seres vivos não chegam ou afetam a Deus, o qual transcende a mente, da mesma maneira que as atividades do mundo não afetam o sol, e as qualidades dos quatro elementos conspícuos (terra, água, fogo e ar) não afetam o espaço sem limites.

Pergunta: Por que samsara (a criação e a manifestação como finitas) é tão cheia de mal e tristeza?

Bhagavan: É a vontade de Deus!

Pergunta: Por que Deus quer que seja assim?

Bhagavan: Isso é incompreensível. Nenhum motivo pode ser atribuído àquele poder - nenhum desejo, nenhum fim a ser atingido pode ser afirmado a respeito daquele Um infinito, todo-poderoso, todo-sábio Ser. Deus é intocado pelas atividades que ocorrem em sua presença. Compare o sol e as atividades do mundo. Não há nenhum sentido em atribuir responsabilidade e motivo ao um antes que ele se torne muitos.

Pergunta: Tudo acontece através da vontade de Deus?

Bhagavan: Não é possível ninguém fazer alguma coisa oposta ao que Deus determina, ele que tem a habilidade de fazer todas as coisas. Portanto, ficar em silêncio aos pés de Deus, tendo abandonado todas as ansiedades da mente perversa, imperfeita e enganadora, é o melhor.

Pergunta: Existe um ser separado, Iswara (Deus pessoal), que é o recompensador das virtudes e o punidor dos pecados? Existe um Deus? Como ele é?

Bhagavan: Sim, existe. Iswara tem individualidade num corpo e mente que são perecíveis, mas ao mesmo tempo, internamente ele tem a consciência transcendental e a liberação.

Iswara, o Deus pessoal, o criador supremo do universo, realmente existe. Mas isso é verdade apenas do ponto de vista relativo daqueles que não realizaram a Verdade, aquelas pessoas que acreditam na realidade da almas individuais. Do ponto de vista absoluto, o sábio não pode aceitar nenhuma outra existência além do Ser impessoal, uno e sem forma.

Iswara tem um corpo físico, uma forma e um nome, mas não tão grosseiro quanto esse corpo material. Ele pode ser visto em visões na forma criada pelo devoto. As formas e os nomes de Deus são muitos e variados, e diferem com cada religião. Sua essência é a mesma que a nossa, o Ser real sendo apenas um e sem forma. Portanto, as formas que ele assume são apenas criações e aparências.

Iswara é imanente em cada pessoa e cada objeto do universo. A totalidade de todas as coisas e todos os seres constitui Deus. Há uma força da qual uma pequena fração tornou-se todo este universo, e o restante está em reserva. Esse poder reservado e esse poder manifesto na forma do mundo, juntos constituem Iswara.

Pergunta: Iswara existe em algum lugar ou em alguma forma particular?

Bhagavan: Se o indivíduo é uma forma, até mesmo o Ser, a Fonte, que é o Senhor, também parecerá ter uma forma. Se a pessoa não é uma forma, uma vez que não pode haver conhecimento das outras coisas, será correta essa afirmação de que Deus tem uma forma? Deus assume qualquer forma imaginada pelo devoto através de pensamento repetido em meditação prolongada. Embora, assim ele assuma nomes infindáveis, apenas a real consciência sem forma é Deus.

No que diz respeito à sua localização, Deus não reside em nenhum outro lugar além do Coração. É devido à ilusão criada pelo ego, a idéia 'eu sou o corpo', que o reino de Deus é concebido como estando em outra parte. Esteja certo que o Coração é o reino de Deus.

Saiba que você é a resplandescente luz perfeita, que não apenas torna a existência do reino de Deus possível, mas que também permite que ele seja visto como um maravilhoso céu. Apenas saber disso é Jnana. Portanto, o reino de Deus está dentro de você. O espaço ilimitado do turiyatita (além dos quatro estados – o Ser), que brilha repentinamente, em todo seu resplendor, dentro do Coração de um aspirante altamente maduro durante o estado de completa absorção da mente, como se fosse uma experiência nova e anteriormente desconhecida, é o raramente atingido reino de Deus (Siva-Loka), que brilha através da luz do Ser.


quinta-feira, março 11, 2010

Por que tal resistência a Deus?

Pergunta: Osho,

Percebi, na palestra de ontem, que estou resistindo à palavra “deus”. Meus pensamentos se voltam para um fato que ocorreu, há vários anos, quando eu estava cuidando de um homem muito doente num hospital – ele estava morrendo. Pediu-me que chamasse um padre, pois ele estava com medo. Quando o padre chegou, o homem doente lhe disse diretamente:

“Deus o amaldiçoe.”

E o padre se afastou, dizendo-me: “Não vale a pena fazer nada por este homem.” Eu disse ao padre: “Este homem está muito doente, e não sabe o que está dizendo.”

Mas o padre, assim mesmo, recusou-se a ajudá-lo. Desde esse dia, nunca mais fui a uma igreja. Sei que Deus está dentro de mim. Então, porque essa resistência? Por favor, ajude-me.




Reposta: A palavra “DEUS” não é Deus. A palavra “amor” não é amor. A palavra “fogo” não é fogo. Por isso, o mais importante é lembrar-se de não se apegar muito às palavras, não ficar muito obcecado com as palavras. As palavras são apenas símbolos indicativos: use-as, mas não se sinta muito oprimido por elas. Se a palavra “deus” lhe causa problemas, esqueça essa palavra. “Alá” também serve, ou “Rarn”, ou “X y Z” – escolha outra palavra, se esta provoca uma associação errada. Mas se você começar a criar uma resistência contra o próprio Deus, contra a própria verdade, apenas você será responsável e apenas você estará perdendo algo de imenso valor. Mas isso acontece. Nós usamos a linguagem; tornamo-nos tão obcecados com a linguagem, que nos esquecemos de que ela não é a realidade. Na verdade, tem-se que colocar a linguagem de lado para se ver a realidade. (...)


(...) Você diz: “Sei que Deus está dentro de mim.” Você não sabe, você não sabe absolutamente. Você ouviu dizer isso. Você me ouviu dizer, ouviu Jesus dizer “Deus está em você”, mas você não sabe absolutamente. Por que, uma vez que você sabe, não há problemas; sabendo que “Deus está em mim”, imediatamente Deus está fora também. No momento em que você perceber um único raio do divino penetrando em você, conhecerá tudo o que existe para ser conhecido. Conhecido o de dentro, o de fora é conhecido. Conhecido o de fora, este se torna conhecido dentro também – pois o de dentro e o de fora não são duas coisas separadas; são dois aspectos da mesma energia.

Assim, esse pensamento de que “Deus está dentro de mim” pode ser um outro truque de sua resistência, pois você não quer ver Deus fora. Você é contra isso, pois bem no fundo de sua mente você sente que, se Deus está lá, então você precisará de um mediador, precisará de alguém para guiá-lo até lá. Se Deus está fora, lá em cima no céu, então alguém será necessário para guiá-lo. Sozinho, você não será capaz de encontrá-lo. Então você diz:

Deus está dentro de mim” – assim não há necessidade do padre. Você está dizendo isso apenas para evitar o padre – mas você não sabe. Deus é tudo. A distinção entre o de fora e o de dentro é falsa. Dentro e fora são um; apenas uma realidade, de uma ponta a outra. Não são duas, não é dual, por isso não a divida.

Ouvi contar... Quando Xerxes estava na praia com sua armada, e olhou para o Helesponto, perguntou a si mesmo: “Como farei para meus homens atravessarem?” Ele ordenou a seus generais que construíssem uma ponte de barcos, e eles obedeceram. Mas uma tempestade veio e destroçou sua ponte. Num acesso de raiva violenta, ele ordenou a execução dos supervisores que dirigiram o trabalho. Mas isso não foi suficiente para satisfazê-lo, pois a sua raiva era grande, quase louca. Então ele ordenou a seus escravos que dessem trezentas chicotadas no mar.

Mas isso é uma tolice – trezentas chicotadas no mar. Mas é assim que a mente funciona; nossa mente é muito infantil. Você já reparou numa criança pequena? Se ela se machuca com uma porta ou um móvel, ela bate na porta ou no móvel, como se eles fosse o inimigo, como se eles tivessem feito alguma coisa a ela. Ela pode ter tropeçado, mas acha que a cadeira é responsável. E essa atitude infantil continua. As pessoas ficam senis, mas sua atitude infantil nunca muda.

No seu caso, um padre não se comportou bem, mas se você for um pouco razoável... Primeira coisa: se um padre não agiu bem, isto não significa que todos os padres estejam errados. Segunda coisa: foi o padre que não agiu bem, não Deus. Terceira coisa: você não sabe o que aconteceu àquele moribundo, no mais profundo do seu ser.

Não se apresse em tirar conclusões. Um homem sábio nunca conclui tão facilmente, pois todas as conclusões fazem Sua mente fechar-se. Você não sabe o suficiente; conclusões são perigosas. Uma conclusão só está certa quando você já conheceu tudo. Os homens mais sábios do mundo disseram que nada sabiam; como podemos nós concluir? E qualquer coisa que saiba-mos é tão pequena, tão ínfima… como se você tivesse lido apenas uma linha da Bíblia e, a partir dessa linha, concluísse alguma coisa. Seria tolice; não seria sábio.

Você pergunta: Então, por que essa resistência? Não penso que a resistência dependa do incidente. Na verdade, todo mundo é resistente em relação a Deus; as desculpas podem ser diferentes. Essa história é uma desculpa – porque não é razoável ficar resistente a Deus apenas por causa desse incidente. Por isso, deve ser uma desculpa. Você quis a resistência – essa história apenas lhe forneceu um argumento, uma desculpa.

Todo mundo é resistente em relação a Deus – por quê? Porque, se quiser conhecer Deus, você tem que desaparecer: essa é a resistência. Você tem que morrer para que Deus viva em você. Você tem que desaparecer completamente, totalmente; você tem que estar vazio, tem que esvaziar-se. Somente no seu vazio Deus pode descer; quando você está muito cheio ele não pode entrar. Sua taça está muito cheia de você mesmo; ela tem que ser esvaziada – esta é a resistência.

Não dê muita importância às desculpas – elas são insignificantes. O problema real se esconde por trás das desculpas. O problema real é: para se tornar religiosa, a pessoa tem que negar a si mesma – este é o único sacrifício necessário. O ego tem que ser abandonado. A mente tem que parar, para que Deus esteja presente – então, é claro que há resistência.

Por isso, esqueça esse incidente. Ele não tem nada a ver… Na verdade, é muito raro eu encontrar uma pessoa que não seja resistente, que não esteja, no fundo, lutando contra Deus. É natural; tente compreender. Queremos permanecer nós mesmos: Deus é o maior perigo. Por isso, as pessoas vão aos padres. Elas poderiam ir diretamente a Deus, mas vão ao padre – pois não querem realmente ir para Deus. O padre protege-as de Deus. Elas vão às escrituras, pois estas estão mortas, e não se pode encontrar um Deus vivo numa escritura. Essa é a maneira de esquivar-se.

As pessoas não vão a um Mestre vivo, porque ir a um Mestre vivo significa saltar no fogo. Você desaparece – mas somente através desse desaparecimento Deus aparece.

Ser realmente religioso é cometer suicídio. É isso mesmo que eu quero dizer – suicídio. Quando uma pessoa se mata, isto não é um suicídio; apenas o corpo muda – ela nascerá de novo. Isso é apenas uma mudança de corpo, uma mudança de roupas, de moradia. Mas quando um homem abandona o ego, ele comete um suicídio real, autêntico; agora ele não voltará mais. Agora não terá mais necessidade de outra moradia neste mundo de miséria, neste mundo de escuridão, neste mundo que é quase um inferno. Ele não voltará mais. Abandonado o ego, sua jornada está terminada; você terá aprendido a lição. Esta é a resistência.

Por isso, por favor esqueça essa desculpa. Do contrário, você continuará pensando nela – e esta não é a causa verdadeira.


Osho - A Divina Melodia

segunda-feira, março 08, 2010

Lao Tzu - versos 70 e 71

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"Meus ensinamentos são fáceis de entender
e fáceis de colocar em prática.
Ainda assim, seu intelecto jamais conseguirá capturá-los,
e se você tentar praticá-los, irá falhar.

Meus ensinamentos são mais antigos que o mundo.
Como pode você compreender seu significado?
Se quiser Me conhecer,
olhe dentro de seu coração.

Não-saber é o conhecimento verdadeiro
Presumir saber é uma doença.
Primeiro perceba que você está doente;
depois poderá sair em busca da cura.

O mestre é seu próprio médico
Ele curou-se de todo saber.
Portanto, ele é verdadeiramente completo."

sábado, março 06, 2010

Poder vs. superstição


Dárcio Dezolt


O conhecimento de que somos seres espirituais, e não materiais, nos deixa imunes às crenças supersticiosas do mundo visível. Temos revelado que nos foi dado “todo o poder, no céu e na terra”, poder divino, espiritual, harmonioso, amoroso, onipresente e oniativo. Quando agimos conscientes de que somos espirituais, em unidade com o Todo Perfeito, agimos conscientes da Divina Ordem que impera em todo o Universo da Realidade.

O desconhecimento da própria natureza espiritual, divina e perfeita faz com que as pessoas se percam em infindáveis crenças supersticiosas ilusórias. Andam com talismãs, cristais ou amuletos de todo tipo, consultam médiuns, cartomantes, astrólogos, numerólogos, etc. Que obtêm de tudo isso? Mais envolvimento com a ilusão! Mais envolvimento com “este mundo”. E muitos ainda creem ser isto um “autoconhecimento”!

Só existe um Autoconhecimento: a percepção tida por Buda, Cristo, Paulo e todos os iluminados: “Eu e o Pai somos um”. Este Autoconhecimento é PODER! O Poder que é AMOR! O AMOR que desconhece MEDO!

Toda procura por “ocultismo supersticioso” mostra que a pessoa está insegura, temerosa ou infeliz. Quem está FELIZ nem se lembra de nada disso! Está vivendo seu precioso AGORA, louvando a Deus, consciente de sua UNIDADE com Ele; e, sua vida vai-se desdobrando harmoniosa e suavemente.

A mente humana é uma ilusão! Se dissermos para alguém que, dentro de uma semana, algo de bom ou de mau lhe irá acontecer, e ele der crédito, o fato humano será gerado por sua crença, e não pela suposta “premonição”. O homem é Expressão de Deus! Dotado do Poder infinito de ser perfeição! Esta Verdade está aqui mesmo, não no mundo visível, mas na Realidade divina transcendental. Assim, se alguém quiser se libertar de todas as superstições falsas ou vazias, bastará orar conforme Cristo nos ensinou:


1. Entrando em seu santuário secreto (Consciência);
2. Percebendo estar sendo visto por Deus (trocando a mente humana pela de Cristo);
3. Aguardando a recompensa interna (a revelação da Unidade Pai-Filho).


Estes três passos o deixarão consciente de que “a natureza do Pai é a natureza do Filho”, e vice-versa.

Todas as “verdades” deste mundo são meras crenças temporais e mutáveis! A Verdade divina é imutável! É a Onipotência, Onipresença, Onisciência e Oniação de Deus! Ao reconhecermos que somos espirituais, em Unidade eterna e imutável com Deus, estaremos deixando de lado todas as superstições deste mundo, deixando de dar a elas realidade e poder, e, ao mesmo tempo, estaremos sendo Luz! Luz que, brilhando “do alto de nosso alqueire”, estará atraindo aqueles que a Ela estiverem receptivos para também a acharem neles próprios!

O mesmo é válido para o que é conhecido como “feitiçaria”, “trabalhos feitos” etc. Nada disso é poder! A Luz que somos é Poder Onipotente e Onipresente! Num de seus livros, Joseph Murphy fala de um amigo a quem fora visitar. Encontrou-o numa cama, reclamando que estava ficando sem movimentos por causa de uma maldição. Como havia terminado o relacionamento com uma mulher supostamente conhecedora de “feitiçaria”, recebeu dela a ameaça de que iria ficar entrevado e pior a cada dia que passasse. Ouvindo aquilo, Murphy pediu a ele o endereço da moça e disse-lhe que iria falar com ela e solicitar o fim daquela prática maligna. Quando voltou, disse-lhe que a moça havia concordado em parar com tudo aquilo, e, a partir de então, o homem passou a melhorar a olhos vistos. Detalhe: ele nem chegara a falar realmente com a tal “feiticeira”!

O único “feiticeiro” que age contra nós chama-se “ignorância espiritual”. Quando todos despertarem para a Verdade de que “o reino não é deste mundo”, de que todas as superstições, ou poderes além de Deus, são “nada”, estas crenças desaparecerão! São ilusão!

Não podemos “servir a dois senhores”. Ou somos seres “à imagem e semelhança de Deus”, ou somos mortais com amuletos ou cristais no pescoço, consultando videntes, contando letras de nomes humanos, carregando “mapas astrais” e sujeitos a pensamentos negativos de qualquer um.

Deus é Tudo! Deus é o Único Poder! Que cada um “semeie para si a justiça”, como lemos em Oséas 10:12.

quinta-feira, março 04, 2010

"Antes que clamem, eu responderei"

Dárcio Dezolt


Há séculos que o mundo vem orando a Deus como se Ele fosse um ser influenciável por choro, petição ou fé. A compreensão equivocada do sentido de que “a fé remove montanhas” deu origem a uma infinidade de preces repetitivas, imbuídas nitidamente da intenção de comover a Deus, para que Ele as atendesse.

A fé remove "montanhas", que são crenças falsas referentes a Deus e Seu Universo. Entretanto, Deus não é influenciado por lamentações, petições repetitivas nem por nada deste mundo. Através da fé, pessoas do mundo reformulam seus conceitos a respeito de algo ou alguém, e conseguem, muitas vezes, os resultados que almejam. Entretanto, nem sempre aquilo ocorre. Por quê? Precisamos entender que a fé correta é aquela em que a intenção de se querer influenciar a Deus é nula. A Perfeição já está estabelecida desde o princípio, e é permanente e imutável. Seja qual for a aparência de desarmonia à nossa frente, ela não passa de ficção. A convicção de que o Amor divino é onipresente é fundamental para que percebamos esta Verdade.

Em Isaías 65:24, podemos ler: “E será que antes que clamem, eu responderei; estando eles ainda falando, eu os ouvirei”. Toda condição de perfeição já está presente e manifesta! A ilusão de que Deus aguarda uma oração humana para corrigir uma imperfeição qualquer precisa ser desmascarada! Ela veio perdurando porque o mundo deu crédito às aparências. Os “resultados favoráveis”, muitas vezes obtidos por pessoas em cega oração, são meras mudanças de aparências. Podemos dizer que “aparência” é uma crença “visível”. Mas ela não se encontra realmente manifesta exteriormente, como crê a maioria. A “crença visível”, como um sonho, nunca sai do âmbito da mente ilusória. O olho humano não está em nosso Corpo real manifesto. Que é o “olho humano”? Um pensamento da mente ilusória! Se a mente humana for anulada, pela percepção de que Deus é a Mente única, o chamado olho humano deixará de parecer existir, pois jamais teve realidade. Em seu lugar, a presença do “Olho Crístico” será reconhecida, e esta Visão absoluta, por estar sempre enxergando a Realidade eterna e perfeita, nada verá que justifique a necessidade de alguma oração.

Sempre que este tema é exposto, invariavelmente surge uma dúvida: “Então ninguém precisa orar?” O conceito errôneo de oração é crença arraigada na suposta mentalidade humana. “Antes que clamem, EU responderei”, diz a citação de Isaías. Ela nos revela a VIDA PELA GRAÇA. O ser humano, incapacitado de discernir a realidade divina já presente, clama a Deus, faz “mentalizações” e dá “tratamentos espirituais”, sem se dar conta de que tais procedimentos, indo além do que podem lhe servir como apoio inicial e momentâneo, acabam acobertando a ilusão de que “aparências” sejam existências verdadeiras. Estes expedientes são úteis como preparação, para que a suposta mente humana fique serena; porém, o que nos basta é a “Graça divina”, ou seja, se não houver um passo além desta tranquilização mental, que é a percepção de que a Mente divina é ÚNICA, não teremos transcendido por completo este ilusório mundo de aparências fraudulentas.

O enfoque absoluto difere por completo do ensino tradicional da Verdade, em que “mestres humanos” são vistos como pessoas escolhidas, iluminadas, etc. Neste estudo, cada um que espontaneamente “sente” a veracidade dos princípios revelados, começa a vivê-los na prática. Toda a sua atenção se focaliza num único ponto: reconhecer que o Absoluto, em Sua totalidade, está MANIFESTO como a sua própria Presença, como o seu próprio EU. Em vista disso, as contemplações da Realidade se tornam o principal e o mais importante do estudo.

Através da “Prática do Silêncio”, habilita-se a erradicar o dualismo. Não existem dois mundos, espiritual e material: há unicamente a Realidade espiritual. “Antes que clamem, Eu responderei”, ou seja, quando se percebe quão absurda é a aceitação de uma mentalidade humana coexistindo com a Mente divina infinita, e que, portanto, é ridícula a ideia de que tal mente finita teria de clamar a Deus para que algo perfeito se manifestasse, tão logo estas crenças sejam desmanteladas, ocorre a automática anulação da suposta “mente humana”. “Eu responderei”, isto é, a Perfeição manifesta fica naturalmente discernida. Este é o mecanismo da oração neste estudo.

A doutrina budista diz o seguinte: “É difícil conhecer o mundo como ele é verdadeiramente, pois, embora pareça real, ele não o é, e embora pareça falso, ele não o é. Os néscios não podem conhecer a Verdade a respeito do mundo”. Nunca é demais repetir que a Verdade não é para o intelecto do suposto ser humano. A mente humana vê matéria onde existe unicamente Espírito; portanto, precisa ser deixada de lado. A Realidade é espiritual, e Ela já é Perfeição Absoluta!

A aceitação errônea de que o mundo humano coexiste com o reino divino deu margem à crença de que o homem tem o livre-arbítrio para fazer acertos ou erros. “Os néscios não podem conhecer a Verdade a respeito do mundo”, podendo, no máximo, apresentar ideias e teorias infundadas, movidos pela ânsia em se considerarem “conhecedores da Verdade”.

A mente humana não tem condições para entender a Sabedoria que compreende este Universo. Por conseguinte, se existissem mestres humanos da Verdade, estes seriam aqueles que estariam admitindo total desconhecimento da natureza real de Deus. Preferimos a colocação baseada na Realidade de que somente existe Deus, ou a Mente divina onisciente, sendo tudo e sendo todos. A humildade verdadeira está em se abrir mão do suposto “conhecimento pessoal” da Verdade, que é teórico, para que haja o reconhecimento de que a onisciência é onipresente. “Eu sou a Onisciência Onipresente” – esta é a maneira de anularmos o chamado ego humano que acredita ser conhecedor parcial ou ignorante total da Verdade. Em termos práticos, a aceitação incondicional de que “Eu sou a Onisciência Onipresente” permite que tenhamos a sabedoria que a cada “agora” nos for requerida. “Antes que clamem, Eu responderei”, ou seja, o tempo não existe. Como sempre está sendo AGORA, é AGORA que a Mente divina está “respondendo” COMO cada um de nós. Os que clamam a Deus creem que o “tempo” existe e passam a usá-lo em súplicas e petições. Assim, ocupam o AGORA com esta ILUSÃO e deixam de perceber o desdobrar contínuo da Harmonia divina como a única Realidade da própria Consciência de cada um.

A segunda parte da citação de Isaías diz: “Estando eles ainda falando, Eu os ouvirei”. O Novo Testamento contém várias passagens em que Jesus também afirma ser sempre “ouvido pelo Pai”. Entretanto, precisamos entender o sentido verdadeiro dessa frase, se não quisermos incorrer em prática de preces ineficazes e destituídas de fundamente espiritual legítimo. A garantia de que Deus sempre nos ouve, para aqueles que aparentemente estão sob o jugo das aparências deste mundo, funciona como um bálsamo. Seu real sentido, porém, é que a Perfeição Absoluta já está manifesta. “Olhos, ouvidos, nariz, língua, corpo e mente (conceitos humanos) são o NADA”, revela o Budismo. Em outras palavras, as aparências só existem como “aparências”, sem que possuam realidade nenhuma! O estudo da Verdade é o reconhecimento de que DEUS É TUDO, e que o Universo já é espiritual e perfeito. Tudo que o ser humano percebe com "olhos, ouvidos, nariz, língua, corpo e mente”, já é NADA. “O que é já foi, e o que há de ser, também já foi; Deus fará renovar-se o que se passou” (Eclesiastes 3: 15).

A “VIDA PELA GRAÇA” é a que traduz uma total confiança em Deus; é a convicção de que estamos acordados no “âmago de um sonho”, sonho este denominado “Existência humana”.