"MAIOR É O QUE ESTÁ EM VÓS DO QUE O QUE ESTÁ NO MUNDO." (I JOÃO 4:4)

sexta-feira, novembro 30, 2012

O Buda interior


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"Reverenciada seja a Perfeição da Sabedoria, o Adorável, o Sagrado!

Avalokita, o Senhor Sagrado e Bodhisatva,  moveu-se nos cursos profundos da sabedoria, rumo ao mundo-além.

Daquelas alturas, Ele olhou para baixo e viu cinco agregados.

E Ele viu que, em si próprios, os agregados eram vazios."



Osho


Eu saúdo o seu Buda interior. Você pode não estar ciente, você pode até mesmo jamais ter sonhado com isso – que você é um Buda, e que ninguém pode ser outra coisa a não ser isso. A natureza búdica (o estado de Buda) é o núcleo essencial do seu ser, e isso não é algo para advir no futuro, mas algo que já aconteceu. É a tua própria fonte. É a origem e é também o objetivo. É a partir de nossa natureza búdica que todos nós nos movemos, e é também para ela que todos nós rumamos. Essa única palavra “natureza búdica” contém tudo – o ciclo completo da vida, do alfa ao ômega.

Mas você está dormindo, você não sabe quem você é. Não que você tenha que se tornar um Buda, mas apenas reconhecer que Ele habita em ti, reconhecer a necessidade se voltar para a sua própria origem. A fim de fazer isso você terá de olhar para dentro de si mesmo. Uma confrontação consigo mesmo irá revelar a sua natureza búdica. O dia vem quando você vê a si mesmo, e quando a existência inteira se torna iluminada. Não é que uma pessoa se torne iluminada – como pode uma pessoa se iluminar? A própria ideia ou pensamento de ser uma pessoa faz parte da mente não iluminada. Não é que eu tenha me tornado iluminado. O “eu” precisa ser descartado antes que se possa conseguir a iluminação. Assim, como poderia eu ter atingido a iluminação? Parece absurdo. No dia em que me tornei iluminado, toda a existência tornou-se iluminada. Desde aquele instante jamais pude ver outra coisa a não ser Budas – nas mais variadas formas, com milhares de nomes distintos, às vezes com mil e um problemas, mas ainda assim todos Budas.

Assim, eu saúdo o seu Buda interior. 

Sinto-me imensamente feliz e satisfeito de ver tantos Budas reunidos aqui. O próprio fato de suas vindas até mim significa o início do reconhecimento. O respeito e o amor em seu coração por mim significam o respeito e o amor para com a sua própria natureza búdica. Confiar em mim não significa confiar em alguma coisa extrínseca a você, a confiança em mim significa a confiança em seu próprio ser. Ao confiar em mim, você vai aprender a confiar em si mesmo. Ao se aproximar de mim, você estará se aproximando de si mesmo. Apenas um reconhecimento necessita ser alcançado. O diamante está aí – você apenas deve ter se esquecido, ou talvez você não tenha se lembrado desde o início. 

Existe um famoso ditado de Emerson: “O homem é Deus em ruínas”. Eu concordo e eu discordo. Esse insight comporta uma dose da verdade – o homem não é o que ele deveria ser. Esse insight está um pouco desordenado, de pernas para o ar. O homem não é Deus em ruínas, o homem é Deus sendo edificado. O homem é um Buda germinando e desabrochando. O botão está ali, ele pode florescer a qualquer momento: apenas uma porção de esforço, um pouco de ajuda... E não será a ajuda que irá causar o fenômeno – ele já está lá! O seu esforço irá apenas revelá-lo a você, ajudando-o a descobrir aquilo que já está lá, oculto. A verdade é eterna.

Ouça com atenção estes sutras porque eles são os mais importantes escritos dentre toda a grande literatura Budista.

Mas eu gostaria começar a partir do verdadeiro ponto inicial. Para entendermos este sutra, é necessário que comecemos corretamente. Apenas usando o correto ponto de partida é que os ensinos do Budismo nos serão proveitosos: estabeleça desde já em seu coração o fato de que você é um Buda. Eu sei que isso pode parecer presunçoso, pode parecer ser bastante teórico e hipotético; você ainda não pode confiar nisso totalmente. Isso é natural, eu compreendo. Apenas permita que a compreensão deste fato esteja aí como uma semente. Em torno desse fato muitas coisas vão começar a acontecer, e somente em torno deste fato é que você será capaz de compreender este sutra. Este sutra é imensamente poderoso – ele bastante pequeno, condensado, da mesma forma que uma semente. Mas se houver o solo apropriado, ou seja, se houver na sua mente o fato exato de que você é um Buda – de que você é um Buda desabrochando, de que você é potencialmente capaz de tornar-se um – e de que nada está faltando, de que tudo está absolutamente pronto, então tudo o que será necessário é colocar as coisas na ordem correta; apenas um pouco mais de estado de alerta se fará necessário, apenas um pouco mais de consciência se fará necessário... O tesouro já está aí; você tem de trazer uma pequena lâmpada para dentro de sua casa. Uma vez que a escuridão desapareça, você não será mais um mendigo, você vai ser um Buda, você será um soberano, um imperador. Este reino inteiro já é seu, tudo é somente uma questão de pedir; você apenas tem de reivindicá-lo.

Mas você nunca será capaz de reivindicá-lo se acreditar é um mendigo. Você não será capaz de protestar por ele; você não será sequer capaz de sonhar com a possibilidade reclamá-lo para si enquanto estiver acreditando que é um mendigo. Essa ideia de que você é um mendigo, de que você é ignorante e pecador, tem sido tão amplamente proclamada em cima de todos os púlpitos ao longo das eras, que isso se tornou uma hipnose profunda em você. Esta hipnose tem de ser quebrada. Para quebrá-la eu começo com: Eu saúdo o Buda em seu interior.

Para mim todos vocês são Budas. Todos os seus esforços a fim de se iluminarem serão ridículos se vocês não forem capazes de aceitar esse fato básico. Isso tem de estar o tempo todo subentendido, é necessário que se torne um entendimento implícito – que você é um Buda!  Esse é o ponto de partida correto a ser adotado, do contrário você se extraviará. Esse é o começo certo! Parta dessa visão e não fique preocupado que isso possa criar algum tipo de ego – o de que “eu sou um Buda”. Não se preocupe, porque todo o processo do Sutra do Coração vai deixar claro para você que o ego é a única coisa que não existe – a única coisa que não existe! Tudo o mais é real. 

Neste mundo existiram sábios que disseram que o mundo é ilusório e que a alma é existencial – o “eu” é verdadeiro ao passo que todo o restante é ilusório, maya. Buda diz exatamente o adverso: ele diz que apenas o “eu” é irreal, tudo o mais é real. E eu concordo com Buda mais do que com qualquer outro ponto de vista. A percepção de Buda é muito penetrante, é a mais aguda e intensa. Ninguém jamais penetrou esses reinos, profundidades e alturas da realidade.

Mas parta dessa visão, comece com essa ideia e ela criará um clima em torno de você. Deixe-a ser declarada a todas as células de seu corpo e a cada pensamento de sua mente; deixe que isso seja declarado em todos os cantos e recantos de sua existência: “EU SOU UM BUDA!”. E não se preocupe com o “eu”. Nós daremos conta dele.

O estado de buda e o “eu” não podem existir ao mesmo tempo. Quando o estado de buda se revela o “eu” desaparece, assim como a escuridão desaparece quando você se aproxima com a luz.

(...)

Este sutra pode ocasionar uma revolução em você.

A primeira coisa a se fazer é iniciar com a pergunta: “Quem sou eu?”. E prossiga indagando. Não pare de investigar. Muitas respostas virão, a mente dirá: “Você é um corpo! Que absurdo! Não há necessidade de perguntar, você já sabe disso”, ou até mesmo “você é a alma, o espírito, a consciência suprema”... Lembre-se, você deve parar apenas quando nenhuma resposta estiver vindo, jamais antes. Enquanto vir alguma resposta dizendo “você é isso, você é aquilo”, saiba bem que a mente o está suprindo com respostas. Quando você chegar ao ponto de indagar “Quem sou eu?” e nenhuma resposta estiver vindo de qualquer lugar, então há silêncio absoluto. A sua pergunta ressoa em si mesmo: “Quem sou eu?”, e há um silêncio e nenhuma resposta surge de lugar algum. Você está absolutamente presente, absolutamente silencioso, e não há sequer uma única vibração. “Quem sou Eu?” – e apenas o silêncio. Então um milagre acontece: de repente você não pode sequer formular a pergunta. A pergunta final tornou-se absurda. As respostas  tornaram-se absurdas e por isso as perguntas também se tornam absurdas. Primeiro desaparecem as respostas e depois desaparecem as perguntas – porque uma somente pode existir ao mesmo tempo que a outra. Elas são como os dois lados de uma moeda – se um lado for retirado o outro não pode ser mantido. Primeiro as respostas desaparecem, depois desaparecem as perguntas. E com o desaparecimento da pergunta e da resposta, você chega à realização: você é transcendental! Então você sabe, e no entanto você não pode dizer; você sabe, mas não consegue articular sobre isso. A partir de seu próprio ser você sabe Quem você é, mas isso não pode ser verbalizado. E esse conhecimento é vívido, existencial; não se trata de um conhecimento emprestado retirado das escrituras. É um conhecimento seu, e não dos outros. Ele surgiu em você.

E com esse surgimento, você é um Buda. Então você começa a rir, porque você veio a saber que você tem sido um Buda desde o princípio de todos os tempos; você apenas não tinha notado esse fato tão profundamente. Você esteve correndo em voltas, para lá e para cá, do lado de fora de seu ser. Mas agora você está em casa.

(...)

Reverenciada seja a Perfeição da Sabedoria, O Adorável, o Sagrado!
Avalokita, o Senhor Sagrado e Bodhisatva, moveu-se nos cursos profundos da sabedoria, para o mundo-além.
Daquelas alturas, Ele olhou para baixo e viu cinco agregados.
E Ele viu que em si próprios, os agregados eram vazios.

Quando você olha daquelas alturas, a partir daquele referencial... Por exemplo, eu disse que estava saudando o seu Buda interior. Essa visão ocorre daquele referencial: essa de que eu vejo todos vocês como Budas. E a outra visão é a de que vocês são apenas cascos vazios. 

Aquilo que você pensa que é nada mais é do que uma couraça vazia. Uma pessoa pensa que é um homem, isso nada mais é do que uma ideia vazia. A Consciência não é masculina nem feminina. Outra pessoa pensa ter um corpo extremamente belo, ela é bonita, forte, isso e aquilo – tudo isso são ideias vazias, todas elas são o ego te enganando. Uma pessoa pensa que conhece/sabe o bastante – algo totalmente insignificante. O  mecanismo dela apenas tem acumulado memória e ela está sendo enganada por suas próprias memórias. Todas essas coisas são vazias.

Assim, quando vejo do ponto de vista transcendental, vejo todos vocês como Budas; por outro lado, eu os vejo como couraças vazias.

Buda disse que a existência do homem consiste na acumulação de cinco elementos, de cinco skandhas (amontoados/agregados), todos eles vazios. E devido à combinação dos cinco, surge um subproduto chamado ego, o self. É exatamente como o funcionamento de um relógio-tique-taque. Você sabe que o tique-taque está vindo dali. Você pode abrir o relógio e separar todas as partes na tentativa de descobrir de onde exatamente está vindo o ruído. Mas você não conseguirá encontrá-lo em lugar algum. O som do tique-taque é um subproduto que surge da combinação de algumas peças. Umas poucas peças funcionando juntas estavam produzindo o ruído.

O seu “eu” nada mais é que isso: cinco elementos combinados e funcionando juntos, produzindo o ruído chamado “eu”. Mas esse “eu” é vazio, não existe nada nele. Tente encontrar ali qualquer coisa substancial e você não conseguirá. 

Essa é uma das percepções mais profundas de Buda: que a vida é vazia – esta vida como a conhecemos é vazia. Mas a vida é plena também, mas nós não sabemos nada sobre isso. A partir deste vazio você tem de se mover em direção a uma plenitude, mas essa plenitude é inconcebível para você neste momento – porque do atual referencial em que você se encontra, essa plenitude parecerá ser vazia. A partir de onde você está olhando, a plenitude parece ser um vazio – um rei parecerá ser um mendigo, um homem de conhecimento e sabedoria parecerá ser tolo e ignorante. 

Uma pequena história:

Certa vez um homem santo aceitou um discípulo, e disse-lhe: “Seria muito bom se você pudesse escrever registrando tudo o que você entende sobre a vida religiosa e sobre o que trouxe você à ela.”

O discípulo foi embora e começou a escrever. Um ano depois ele voltou ao mestre e disse: “Eu trabalhei muito duro nisso, e aqui estão as principais razões da minha busca.”

O mestre leu os registros, que comportavam milhares de palavras, e então disse ao jovem aluno: “seu trabalho está admiravelmente embasado e fundamentado, mas está um pouco longo demais. Tente diminuir um pouco.” Assim, o novato foi embora e depois de cinco anos voltou com apenas cem páginas.

O mestre sorriu e, depois de ter lido os papeis, disse: “Agora você está realmente se aproximando do centro da questão. Seus pensamentos têm clareza e força, mas ainda está um pouco longo... tente reduzir mais.”

O novato foi embora triste, pois ele tinha trabalhado duro para alcançar a essência. Mas depois de dez anos ele voltou e, curvando-se perante o mestre, ofereceu-lhe apenas cinco páginas, e disse: “Esse é o núcleo da minha fé, o âmago da minha vida, e peço sua bênçãos por ter me conduzido até ele.”

O mestre leu bem devagar e com cuidado: “É realmente maravilhoso”, disse ele, “toda essa simplicidade e beleza... mas ainda não está perfeito. Tente chegar a uma clarificação final." 

E quando o mestre tinha chegado aos seus últimos tempos e estava se preparando para o seu fim, seu aluno veio a ele novamente e, de joelhos dobrados diante dele para receber suas bênçãos, entregou-lhe uma folha de papel em que nada estava escrito.

Em seguida o mestre colocou as mãos sobre a cabeça de seu amigo e disse: “Agora... agora você entendeu.”

Se você está imerso no referencial mundano, ao tentar compreender o transcendental, ele terá uma aparência de NADA para você. E se você estiver imerso no referencial transcendental, ao olhar para o mundano, ele também terá a MESMA aparência de nada para você. Olhando daqui onde estou, tudo o que você tem é vazio; e olhando a partir do lugar onde você está, o que eu tenho é vazio, nada.

Buda parece vazio – apenas o puro nada – para você. Por causa de suas ideias, por causa de seus apegos, por causa de sua possessividade sobre as coisas, Buda parece vazio. Buda é pleno, completo: você é vazio. E a visão dele é absoluta, e sua visão é apenas relativa. 

O Sutra diz:

Reverenciada seja a Perfeição da Sabedoria, O Adorável, o Sagrado!
Avalokita, o Senhor Sagrado e Bodhisatva, moveu-se nos cursos profundos da sabedoria, para o mundo-além.
Daquelas alturas, Ele olhou para baixo e viu cinco agregados.
E Ele viu que em si próprios, os agregados eram vazios.

O vazio é a chave do Budismo – shunyata. Medite sobre este sutra – medite com amor, com simpatia, não com a lógica e a razão. Se você lidar com este sutra com a lógica e a razão, acabará por matar o seu espírito.  Não raciocine, e não tente dissecá-lo. Tente compreender os sutras como eles são, e não traga a sua mente – sua mente será uma interferência.

Se você puder lidar com este sutra sem a interferência da mente, uma grande claridade ocorrerá a você.

Osho - The Heart Sutra


quinta-feira, novembro 29, 2012

Entrega é Compreensão (Osho)

Querido Osho,

Percebo que quando me entrego, faço isso para poder alcançar a minha meta. Eu busco me entregar para obter a LIBERDADE, então penso que minha entrega não se trata de uma entrega verdadeira. Eu consigo testemunhar isso, mas o problema é que é justamente este “eu” que está testemunhando. Portanto, tudo o que decorre a partir desse “eu” que testemunha só pode ser um reforço para o ego. Eu me sinto enganada pelo meu ego.




Osho: Você ainda não entendeu o que é a entrega.

A primeira coisa a lembrar sobre a entrega é: você não pode fazê-la; a entrega não é um fazer. Você pode evitar o seu acontecimento, mas você não pode fazer com que ela ocorra. Ela está além do alcance de nosso fazer. O poder que temos sobre a entrega é apenas negativo: temos o poder de impedi-la, mas não temos o poder de fazer com que ela aconteça.

Entregar-se não é algo que você possa fazer. Se você puder, não se trata de entrega, porque o fazedor está presente. A entrega/rendição é um grande entendimento de que “eu não sou”. A rendição é uma visão (insight) de que o ego não existe, de que “eu não estou separado”. A entrega não é um ato, mas uma compreensão.

Em primeiro lugar você é falso, a separação é falsa. Nem por um único momento você pode existir separado do universo. A árvore não pode existir se estiver desenraizada/desligada da terra. A terra não pode existir se o sol desaparecer amanhã. A árvore não pode existir se água não estiver chegando às suas raízes. A árvore não pode existir se não puder respirar. A árvore está enraizada em todos os cinco elementos – aquilo que os budistas denominam Skandhas. Avalokita... quando Buda chegou à visão transcendental, depois de ter passado por todos os estágios e ter ido além do mundo – de lá ele olhou para trás – o que ele viu? Ele viu apenas cinco agregados (acúmulos, combinações) com nada de substancial neles, apenas o vazio, shunyata.

A árvore não poderia existir sem que esses cinco elementos estivessem constantemente vertendo energia para ela. A árvore é apenas uma combinação desses cinco elementos. Se árvore começar a pensar “eu sou”, então haverá miséria para ela. E ela criaria um inferno para si mesma. Mas as árvores não são assim tão tolas, elas não carregam qualquer mente. Elas estão lá, e se amanhã elas desaparecerem, então simplesmente desapareceram. Elas simplesmente não se apegam, porque não existe um “alguém” para apegar-se. A árvore está constantemente entregue à existência. Por “entrega” quero dizer que ela nunca está separada, que nunca ocorreu a ela essa ideia estúpida de ego. E assim são os pássaros, as montanhas, as estrelas. Foi somente o homem que transformou a sua grande oportunidade de estar consciente para um estado de consciência-de-si-mesmo. Ser simplesmente consciente, ao invés de consciente de si mesmo – é disto que estou falando. O ser humano é dotado de consciência. Se a consciência floresce e se expande, ela pode trazer-lhe a maior felicidade possível. Mas se alguma coisa der errado e a consciência azedar, convertendo-se em consciência-de-si-mesmo, então um inferno é criado, a miséria é criada. Ambas as alternativas estão sempre abertas; cabe a você escolher.

A primeira coisa a ser entendida sobre o ego é que ele não existe. Ninguém existe na separação. Você é tão UM com o universo como eu sou, como Buda é, como Jesus é. Eu sei disso, você não sabe disso ainda. A diferença é apenas de reconhecimento. A diferença não é existencial, absolutamente não é! Assim, o que você tem de fazer é olhar e investigar essa ideia estúpida de separação. Agora, perceba que ao tentar se entregar você ainda está carregando a ideia de separação. Você está pensando “eu vou me entregar, agora eu vou me render”. Na entrega não existe nenhum “eu” – mas você pensa que existe. Isso arruinará todos os seus esforços.

Explorando e investigando detalhadamente a ideia de separação, um dia você descobre que não está separado; assim, como você pode se entregar? Não há ninguém para se render! Nunca houve! Aquele que realiza a entrega simplesmente não existe, não está em lugar nenhum. Se você for para dentro de si mesmo, não encontrará em parte alguma um “eu” que possa se render. Esse é o momento em que afinal ocorre a rendição. Quando o “eu” que realiza a entrega não é encontrado (porque chegou-se à compreensão de que ele não existe), esse é o momento em que ocorre a entrega. Você não pode fazer. Se puder fazê-lo, trata-se de uma coisa falsa. E da falsidade decorre somente mais falsidade. Ao carregar a ideia “eu existo, eu sou” você é falso; por isso qualquer coisa que vier a fazer também será falsa. E uma falsidade leva à outra, que por sua vez conduz à outra, e assim por diante. Dentre todas a falsidade mais fundamental é o ego, a ideia “eu estou separado”.

Você diz: “eu me entrego para poder alcançar o meu objetivo.”

O ego está sempre orientado para um objetivo. É sempre ganancioso, está sempre se agarrando a algo. Ele está sempre em busca de mais e mais e mais; é essa ideia de “mais” que sustenta a vida do ego. Se você tem dinheiro, ele almejará ter mais dinheiro; se você tiver uma casa, ele desejará ter uma casa maior; se você tem uma mulher, o ego desejará uma mulher ainda mais bela. O ego sempre quererá mais. Ele tem uma fome incessante. O ego vive no futuro e no passado. Quando o ego está vivendo no passado, ele vive como um colecionador – “eu tenho isto, mais isto e aquilo outro”. Ele sente uma grande satisfação. “Eu tenho isto” – poder, prestígio, dinheiro. Essas coisas conferem um tipo de realidade a ele. Elas dão a ele a noção de que “se eu possuo estas coisas, então eu devo estar ali”; devido a tais coisas o ego consegue dizer “eu existo”. E quando o ego está vivendo no futuro, ele o faz através da ideia de “mais, mais e mais”. Assim, ele vive da memória e também do desejo.

O que é um objetivo? É um desejo: “eu tenho que chegar lá, tenho que ser aquilo, tenho que alcançar.” O ego não consegue viver no presente, porque o presente é real e o ego é irreal – eles nunca se encontram. O passado é irreal, simplesmente não existe mais. O passado já foi real, mas enquanto ele estava presente o ego não estava lá. Tão logo tenha desaparecido, ele perde a qualidade de ser existencial, e o ego imediatamente passa a colecionar e a acumulá-lo. O ego agarra e acumula coisas mortas. O ego é um cemitério: recolhe cadáveres e ossos mortos.

Ou ego também vive no futuro. Mais uma vez, o futuro também é não existencial; o futuro ainda não é – é apenas imaginação, fantasia, sonho. O ego também pode viver através disso muito facilmente. Uma falsidade harmoniza-se muito bem com outra falsidade; todas as falsidades combinam perfeitamente. Traga qualquer coisa existencial e o ego logo desaparece. Por isso a insistência para que você esteja no presente, no aqui e no agora. Apenas este momento... Se você for inteligente, poderá dispensar todo e qualquer pensamento acerca do que agora estou falando, perceberá que aquilo sobre o qual estou discorrendo não é para ser pensado ou analisado, mas simplesmente visto com intensidade e totalidade neste exato momento. Uma visão intensa, alerta, penetrante, focada, direta, imediata, abrangente, total... e onde está o ego? Há apenas um grande silêncio, nenhum passado existe, nenhum futuro existe, apenas este momento está aqui. Então este momento “é” e você “não é”. Permita (autorize) que este momento seja e você não seja. Sentirá um silêncio imenso, um silêncio profundo, dentro e fora. E então não haverá nenhuma necessidade de se entregar, pois você se alinhou com a verdade de que na realidade você não existe, você não é – apenas o momento presente é. Essa compreensão em si realiza a entrega. Entregar-se significa compreender verdadeiramente que você “não é”.

Não é uma questão de que você tenha de entregar-se a mim, ou de que você tenha que entregar-se a Deus. Não é sequer uma questão de que você tenha de entregar-se, absolutamente. A entrega é um insight, uma compreensão de que “eu não sou”. Percebendo que “eu não sou, eu sou um nada, eu sou um vazio”, a entrega aumenta cada vez mais. A flor da entrega cresce na árvore da vacuidade. Ela jamais pode estar orientada para o cumprimento de um objetivo.

Na natureza do ego é estar orientado para um objetivo. Ele anseia pelo futuro. Ele pode ansiar até mesmo pela outra vida, pode ansiar pelo céu, pelo nirvana. Não importa aquilo pelo qual o ego anseia – ansiedade é sempre ansiedade, desejo é sempre desejo, tudo isso está sendo projetado no futuro.

Perceba isso! Perceba de uma só vez a totalidade do mecanismo da mente. Eu não estou dizendo “pense sobre isto”. Se você pensar, terá errado o alvo. Novamente, o pensar tem a ver com o passado e futuro. Olhe atentamente para isso, e perceba! Faça isso, e faça agora! Não diga a si mesmo: “ok, farei depois que chegar em casa”. Se você adiar, o ego apareceu, o objetivo surgiu, o futuro entrou. Todas as vezes que você envolver o tempo, estará caindo na armadilha da separação.

Permita que o momento esteja aqui, apenas este momento. E então você percebe o que você é – você está aqui, você não vai a lugar algum, e você não está vindo de lugar nenhum. Você sempre esteve aqui. Aqui é o único momento, o único espaço. Agora é a única existência. É neste Agora que existe a rendição.

“Eu me entrego para alcançar o meu objetivo”, você diz. “Eu busco me entregar para obter a liberdade.”

Mas você é livre! Jamais você esteve aprisionada. Você é livre, mas de novo há o velho problema: você deseja a liberdade, mas não compreende que você só pode ser verdadeiramente livre quando for livre de si mesma – não existe outra liberdade além dessa. Todas as vezes que você pensa sobre a liberdade, você imagina que o seu “eu” estará lá e será livre. Mas você não vai estar lá, somente a liberdade estará. Liberdade significa que liberdade do próprio “eu”, ao invés de “liberdade usufruída pelo eu”. No momento em que a prisão desaparece, o prisioneiro também desaparece, porque o prisioneiro é a prisão! Prisioneiro e prisão são um. No momento em que você deixar a prisão, você também não será. Haverá apenas um puro céu, puro espaço. Esse espaço puro é chamado nirvana, moksha, liberação.

Compreenda o que é liberdade, ao invés de tentar obtê-la.

“Eu busco me entregar para obter a liberdade.”

Nesse caso, você está usando a entrega como um meio, enquanto que a entrega é o objetivo, é o fim em si mesmo. Quando eu digo que a entrega é a nossa meta, não estou dizendo que a entrega tem de ser alcançada em algum lugar no futuro. Eu estou dizendo que a entrega não é uma ação, não é uma ferramenta, não é uma técnica, enfim, não é um meio a ser empregado; ela é uma finalidade em si mesma. Não é que a entrega o conduza à liberdade, entrega é liberdade! Elas são sinônimos, significam exatamente a mesma coisa. Você está olhando para a mesma coisa de dois ângulos diferentes.

“... por isso penso que minha entrega não se trata uma entrega verdadeira.”

Sua entrega não é real nem irreal. Não se trata nem mesmo de entrega, absolutamente. Nem sequer é irreal.

“Eu consigo testemunhar isso, mas o problema é que é justamente este ‘eu’ que está testemunhando. Portanto, tudo o que decorre a partir desse “eu” que testemunha só pode ser um reforço para o ego. Eu me sinto enganada pelo meu ego.”

Quem é este “eu” que você diz estar se sentindo enganado pelo ego? É o próprio ego. O ego é tal que ele pode dividir a si próprio em vários fragmentos, em várias partes, e então começa o jogo. Você é ao mesmo tempo o caçador e a caça. Exatamente como um cachorro tentando agarrar a própria cauda, saltando de um lado para o outro e contorcendo-se. E você olha e vê a absurdidade disso – mas você vê o absurdo, o cão não pode vê-lo. Quanto mais ele acha difícil agarrar a cauda, mais louco ele fica, e mais ele salta. E quanto mais rápido e alto o cão salta, mais alto e mais e rápido é o salto da cauda. E o cão não consegue conceber o que está acontecendo: ele, um grande e exímio apanhador, não consegue agarrar uma simples cauda?

Isso é exatamente que está acontecendo com você. É o “eu” que se empenha em apanhar, e que o tempo todo é o caçador e a presa. Perceba como isso é ridículo e, mediante essa própria percepção, livre-se de tudo isso.

Não há nada a ser feito, absolutamente – nem mesmo uma única coisa. Eu digo: vocês já são aquilo que você desejam se tornar. Vocês são Budas, jamais vocês foram outra coisa. Basta que percebam.

E quando você diz “eu consigo testemunhar”, de novo isso é o próprio ego. Sempre que você empreender a ação de testemunhar, o “eu” será criado novamente, porque o ato de testemunhar também é um fazer, há um esforço envolvido. Relaxe. No relaxamento – quando não há nada a ser observado e ninguém para observar, ou seja, quando você não mais estiver integrado às divisões da dualidade – então surge uma diferente qualidade/espécie de testemunhar. Haverá o testemunhar, mas não haverá a ação de testemunhar. O “eu” não terá qualquer ação para praticar. E o “eu” somente pode sobreviver se houver uma ação ao qual possa se agarrar, porque é da ação que ele retira o seu senso de “eu sou”. Assim, diante desse tipo de testemunhar o ego é impotente. Lembre-se: o testemunhar existe e ocorre por si mesmo, tendo uma característica suave e passiva. Ele não é agressivo. Se houver ação, o testemunhar se torna agressivo: o esforço passa a ser necessário, você tem de estar tenso. Esteja à vontade, descontraído, relaxado. Fique no momento presente. Simplesmente esteja aí, permitindo que tudo seja e ocorra por si mesmo. Nessa consciência em que você está apenas aí sentado sem fazer nada, a primavera chega e a grama cresce por si só.

Esta é a síntese de toda a abordagem budista: O que quer que você faça apenas criará e reforçará ainda mais o fazedor (ego) – incluindo testemunhar, pensar, entregar-se. Qualquer coisa que você fizer vai criar a armadilha. Nada é necessário a ser feito de sua parte. Apenas ser... e deixar as coisas acontecerem. Não tente controlar, não tente manipular. Deixe que a brisa passe por você, permita que os raios solares cheguem, permita a vida dançar, e quando chegar o momento deixe que a morte venha e dance a sua dança em você também.

Para mim esse é o significado de sannyas: não é algo que você faz, e sim quando você abandonou todo o fazer porque percebeu a absurdidade disso tudo. Quem você pensa que é para fazer alguma coisa? Você é somente uma onda nesse imenso oceano. Num dia você é, noutro dia você desaparecerá; o oceano continuará. Por que você deveria ficar tão preocupado? Você surge e desaparece. Enquanto isso, durante esse pequeno intervalo, você se torna tão preocupado e tenso, que você toma sobre si todos os fardos, e carrega pedras em seu coração – e por razão nenhuma.

Vocês são livres neste exato momento!

Eu os declaro iluminados neste exato momento. Mas vocês não confiam em mim. Vocês dizem: “Está bem, Osho, mas apenas diga-nos como nos tornamos iluminados.”

Esse impulso de querer se tornar, de querer alcançar e de desejar, segue saltando sobre cada objeto com que você se depara. Às vezes ocorre com o dinheiro, às vezes com Deus. Às vezes com o poder, às vezes com a meditação – o objeto pode ser qualquer um, e você logo o agarra. Mas não se apegue, não possua; o desprendimento é o caminho para viver a vida real, a vida verdadeira.

Deixe as coisas acontecerem, deixe a vida ser um acontecimento, e haverá apenas alegria, regozijo, júbilo – de modo que jamais poderá haver uma frustração, porque você nunca esperou por nada em primeiro lugar. O que quer que venha é bom, é bem-vindo. Não há o fracasso, nem o sucesso. O jogo do sucesso e do fracasso foi descartado. O sol aparece pela manhã e o acorda, e a lua surge à noite cantando uma canção de ninar e você vai dormir. A fome vem e você come, e assim por diante. Isso é o que os mestres Zen querem dizer quando declaram: “Se estiver com fome, coma; quando estiver com sono, vá dormir. Não existe outro caminho.”

E eu não estou lhe ensinando a ser inativo. Eu não estou dizendo para não ir trabalhar. Não estou dizendo para deixar ganhar o seu pão, nem estou dizendo para renunciar ao mundo e depender dos outros – não, de modo algum. Mas não seja um fazedor. Sim, você tem de comer quando está com fome, e para comer você tem de ganhar o seu pão – mas torne-se alerta de que não existe ninguém fazendo isso. É a fome em si que está agindo, mas não há ninguém fazendo isso. É a sede em si que o leva a procurar por um poço ou por um rio. É a própria sede agindo; não existe ninguém para estar com sede. Descarte de sua vida os nomes e pronomes e deixe que apenas os verbos existam.

Buda diz: A verdade é igual a quando você vê um dançarino: o dançarino não existe, apenas a dança. Quando você se depara com um rio, em verdade não há o rio, mas apenas o fluir do rio. Existe o verbo e não o nome. Quando você vê uma árvore, não há a árvore, existe apenas o processo contínuo e constante de “ser” da árvore. Quando você olha para um sorriso, não há ninguém sorrindo, há apenas o sorriso: o verbo do sorrir está acontecendo. A vida é um processo.

Mas nós fomos acostumados a pensar sempre em termos de substantivos: nomes consumados, estáticos. Isso cria problema. Na vida nada está concluído ou estagnado – tudo é um fluxo, um fluir. Aprenda a viver com isso, flua com isso, flua com este rio, e nunca seja um fazedor. Mesmo quando você estiver fazendo, não seja um fazedor. Apenas o fazer existe, mas não há o agente. Quando esse insight se estabelecer profundamente em você, então não haverá nada mais.

A iluminação não é algo como um objetivo a ser alcançado. Ela é esta própria vida simples e comum que o rodeia. Mas quando você não está se esforçando ou lutando ocorre um milagre: esta vida comum torna-se extraordinariamente bela. Então as árvores são mais verdes, então os pássaros cantam em tons mais ricos, e tudo o que está acontecendo ao redor é precioso. Pedras comuns são diamantes.

Aceite esta vida tão simples e comum. Basta descartar o fazedor, o “eu”. E quando eu digo para descartar o fazedor, não se torne nesse ato um fazedor! Basta olhar para ele, compreendendo a sua irrealidade. E ele desaparece.


OSHO - The Heart Sutra


terça-feira, novembro 27, 2012

Seja qual for o seu caminho...


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Seja qual for o seu caminho, seja você mesmo.
Seja qual for o seu caminho, seja generoso.
Seja qual for o seu caminho, seja justo.
Seja qual for o seu caminho, seja impecável.
Seja qual for o seu caminho, seja verdadeiro consigo mesmo.
Seja qual for o seu caminho, seja amoroso.
Seja qual for o seu caminho, seja mestre de si mesmo.
Seja qual for o seu caminho, seja alerta sobre suas emoções.
Seja qual for o seu caminho, saiba que a vida é um sonho.
Seja qual for o seu caminho, seja não domesticável.
Seja qual for o seu caminho, seja livre.
Seja qual for o seu caminho, tenha compaixão.
Seja qual for o seu caminho, seja responsável.

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 - Um salve a todos os mestres que já caminharam nesta Terra! -

sábado, novembro 24, 2012

A Consciência é tudo o que existe

Ramesh Balsekar


O valor ou a utilidade de um conceito está apenas no quanto ele aponta para a Verdade.

Ramesh: No que diz respeito ao "Eu Sou", não faz diferença se há a manifestação ou não. A manifestação veio do Eu Sou. O funcionamento da manifestação está no Eu Sou. É como o reflexo num espelho. Então o que você aceita, e o que quer que aconteça é meramente um reflexo no Eu Sou. Toda a manifestação é um reflexo na Fonte - de outro modo, haveria dois.

Peter: Portanto, não pode ser um reflexo da fonte, é um reflexo na Fonte?

Ramesh: Apenas pode ser na Fonte. Tudo isto é um reflexo na Fonte porque a Fonte é tudo que existe. Portanto, para qualquer coisa que acontece, você escolhe um conceito. Você não pode ficar sem conceitos, senão você teria que ficar em silêncio. E se a questão "Quem sou eu?" surge, esse é o primeiro pensamento de todos que precisa de uma resposta. A resposta é um conceito, um conceito sendo algo que aponta para a Verdade. O valor ou a utilidade de um conceito está apenas no quanto ele aponta para a Verdade. Você vê? E esse conceito - que é a totalidade da manifestação e o funcionamento desta manifestação é um reflexo na Fonte - é um apontador para a Verdade, a qual é a Fonte.

"Assim como a superfície de um espelho existe dentro e fora da imagem refletida no espelho, também o Ser supremo existe tanto dentro quanto fora do corpo físico." (Ashtavakra)

Nesse verso importante, Ashtavakra aponta que o que nós somos como sujeitos definidamente, não é uma coisa ou um objeto, que o pronome pessoal inevitavelmente sugere, mas mais um processo ou um pano de fundo, como a tela na qual um filme é visto. Na ausência de um pano de fundo não poderia haver nenhuma aparência de modo algum, embora no caso da manifestação fenomenal, o próprio "pano de fundo" - a Consciência - constitui a aparência e é responsável por ela. O ponto é que a menos que houver um total "afastamento" para a impessoalidade, a consideração "quem ou o que sou eu?" pode significar de fato uma transferência simples de mais - do objeto para o sujeito (da fenomenalidade para a não-fenomelalidade / do manifesto para o não-manifesto). Isso não teria força suficiente para quebrar o condicionamento trazido pela noção de identidade que conduz à suposta limitação. É apenas um afastamento direto para a impessoalidade que é mais provável de trazer a alarmante transformação conhecida como metanoesis, onde há uma convicção repentina e imediata de que a identificação com uma entidade individual separada, na verdade, nunca existiu realmente e era essencialmente nada além de uma ilusão.

Talvez seja por essa razão que Ashtavakra sugere a analogia do espelho para a Consciência, a qual reflete tudo, não retém nada, e em Si mesma não tem existência perceptível. Isto é, a Consciência é o pano de fundo do que parecemos ser como objetos (fenômenos), e ainda ela não é algo objetivo (um objeto). Assim como um reflexo no espelho é uma mera aparência sem nenhuma existência, e o espelho é o que tem existência, mas não é afetado de maneira nenhuma pelo que está refletido, assim também o aparato psicossomático (o organismo corpo-mente), sendo apenas uma aparência na Consciência, não tem existência independente. A Consciência na qual ele aparece não é afetada de forma nenhuma pela aparência dos objetos nela.

A Fonte que criou esta manifestação dentro de Si como um reflexo, está fazendo esta manifestação funcionar. Portanto, a manifestação e seu funcionamento, os quais chamamos de vida - toda ela é um reflexo na Fonte.

Primeiro há a Fonte. A Fonte cria um reflexo. O reflexo é o Eu Sou. Agora, Ramana Maharshi diz que a Fonte é o "Eu-Eu". Ele A nomeia de "Eu-Eu" meramente para distingui-la do Eu Sou. O "Eu-Eu" é a Energia latente (potencial). A Energia Potencial torna-se ativa na forma de manifestação como o Eu Sou, e torna-se ciente da manifestação. O Eu Sou é a Consciência (awareness) impessoal da manifestação e do seu funcionamento. Então, para o funcionamento da manifestação acontecer, a Fonte - ou Deus, ou o Eu Sou - cria estes organismos corpo-mente e, por conseguinte "eu's" individuais, ao identificar a Si mesma com esses organismos corpo-mente. Portanto, a Energia Universal, a Energia Potencial, torna-se ativa nesta manifestação. O "Eu-Eu" ao sair do estado latente, torna-se o Eu Sou, e o Eu Sou torna-se o eu sou Markus. Por que o Eu Sou torna-se Markus? Porque sem o Markus e os outros bilhões de nomes, a vida como conhecemos não aconteceria.

Então, a manifestação é real? Ela é real e irreal. A questão - a manifestação é real ou não? Está errada. A manifestação é tanto real quanto irreal: real na medida em que ela pode ser observada, irreal com base que ela não tem existência independente própria dela, sem a Consciência. Desse modo, a única coisa que tem existência independente dela própria é a Realidade, e essa Realidade é a Consciência. A Consciência é a única Realidade. Todo o resto é um reflexo dessa Realidade dentro de Si mesma.

Lance: Estou tendo problemas em entender o "Eu-Eu" e o Eu Sou.

Ramesh: Não existem problemas, pois eles não são dois. A Consciência-em-repouso é o Eu-Eu. Quando ela está em movimento ela é o Eu Sou. Portanto, o Eu-Eu é um conceito que realmente não te interessa. É apenas um conceito. O que realmente te interessa é o Eu Sou.

Lance: O Eu sou é a totalidade da manifestação.

Ramesh: Correto.

Lance: Então quando estamos no estado de sono o que ele vira?

Ramesh: Eu Sou, pois há um corpo ali e ele está na fenomenalidade.

Lance: Portanto, quando não existe a manifestação há somente o Eu-Eu.

Ramesh: Sim.

Lance: Num livro sobre Ramana Maharshi é dito que quando investigamos a fundo "Quem sou eu?", encontramos o nada.

Ramesh: Está vendo, Ramana Maharshi, portanto, não distingue realmente entre o "Eu-Eu" e o "Eu sou" porque é inútil. O Eu-Eu é meramente um conceito a respeito do qual ele falou, por que se preocupar. O que interessa a você é o Eu Sou e o eu sou Lance. E quando o Lance não está aí, o Eu Sou está.

Lance: O que é o estado de sonhos então?

Ramesh: O estado de sono com sonhos é a Consciência-em-ação identificada. O que é o sonho da vida, então? O sonho da vida é o sonho do Eu Sou. O Lance tem um sonho pessoal e o Eu Sou tem o sonho vivo. Desse modo, o que acontece na verdade é que você acorda do seu sonho pessoal para o sonho vivo.

Lance: No sono profundo existe o Eu-Eu?

Ramesh: O Eu Sou! O Eu-Eu realmente não te interessa.

Lance: Mas agora sinto necessidade de saber.

Ramesh: Então da onde vem o Eu Sou? Essa é uma questão conceitual. E para essa pergunta conceitual a resposta conceitual é que o Eu Sou é a Energia impessoal tornada ativa na forma de manifestação, e o Eu-Eu é a Energia Potencial (latente). O "eu" pessoal que o Lance pensa que é ele, é a Energia impessoal identificando-se como um ego que pensa que ele é o fazedor e que precisa saber. Quando verdadeiramente não há mais questões, então não há fazedor. Onde não há fazedor não há ego. E onde não há ego, aí o Eu Sou brilha a partir de um organismo corpo-mente sem identificação pessoal. Quando o organismo corpo-mente morre, o Eu Sou continua como Eu Sou. E quando a totalidade da manifestação chega a um fim, ai o Eu Sou é Eu-Eu, a Consciência-em-repouso. E tudo isso é um conceito.

Peter: Você disse que o "eu" no Eu Sou não é o Ego. Mas o que é ele? Eu não entendi quando você disse o Eu-Eu.

Ramesh: Você vê, a Consciência não ciente de Si mesma, a Energia Potencial, é um conceito. Não cometa engano! Eu-Eu, Eu Sou, eu sou Peter - a coisa toda é um conceito com o intuito de compreender a sua natureza real. Assim o Eu-Eu é a Energia Potencial antes da manifestação.

Peter: A manifestação de mim?

Ramesh: Não. A totalidade da manifestação.

Peter: Portanto, esse Eu é totalmente não individual?

Ramesh: Isso. Bem, na verdade, seja Eu-Eu, Eu Sou - eles não são dois. O Eu-Eu torna-se Eu Sou na manifestação. O Eu-Eu torna-se ciente de Si mesmo na forma de Eu sou. Mas é a mesma Consciência una.

Peter: É um nome para a Consciência? Um rótulo para a Consciência?

Ramesh: Isso mesmo. Um conceito. É por isso que falo sempre que o Eu Sou torna-se um conceito quando você fala sobre ele. Essa pura Ciência (awareness) da Existência é a Verdade, mas a partir do momento que eu falo a respeito dela, Ela se torna um conceito.

Peter: Qual é a relação entre a Consciência e a palavra "Eu"?

Ramesh: Esse é apenas um nome dado para a Consciência.

Peter: Sim, é o que você acabou de chamar de rótulo.

Ramesh: Sim. Você vê, até "Consciência" é um rótulo. "Deus" é um rótulo.

Peter: É confuso usar o "eu" que usamos para nossa individualidade nesse contexto.

Ramesh: Portanto, eu digo Eu-Eu, Eu Sou e eu sou Peter.

Peter: São três "eus" diferentes.

Ramesh: Ou é a mesma Consciência, mas a relevância é para um ponto diferente.

Peter: O último indica o ego.

Ramesh: O último indica o ego.

Peter: O do meio, Eu Sou ...

Ramesh: A Consciência impessoal.

Peter: E o Eu-Eu ...

Ramesh: É a Consciência impessoal antes ...

Peter: Da potencialização, da manifestação.

Ramesh: Sim, correto. De novo, são palavras para explicar a mesma coisa.

Pergunta: Num certo momento perguntaram para Nisargadatta Maharaj, "Existe algo que seja real nesse jogo?" Ele disse algo parecido com, "A ação do amor." Foi tudo o que ele disse, eu acho.

Ramesh: A ação do amor? De qualquer forma, o que quer que ele tenha dito, eu te digo o que ele estava querendo dizer. (risos)

A questão é, "O que é real?" O que é real é a conexão inseparável entre o real real e o falso real. Tem de haver uma conexão senão seriam dois. Então, o que os mantém juntos, unidos? É o amor. Chame isso de compaixão, de como você quiser, o melhor é não chamá-lo de nada. Isso é o que ele quis dizer.


quinta-feira, novembro 22, 2012

Cantiga Franciscana

Pe. Zezinho


Caro irmão sol, cara irmã lua;
Vós irmãs estrelas que no céu brilhais. 
Vós irmãos planetas, que ao redor do sol girais,
Vós constelações e corpos siderais.
Nós aqui na terra, vós no firmamento,
Num só pensamento, numa só canção.
Celebremos juntos, numa sinfonia,
A sabedoria de Quem nos criou.
Vós, ó criaturas que nem conhecemos,
Anjos e arcanjos, vós ó querubins;
Vós ó serafins, Vós ó não humanos, 
Se nos escutais, se podeis orar, adorai conosco.

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segunda-feira, novembro 19, 2012

O sutra de Yakuzan

Osho


E agora o Sutra...

O sutra é bastante extenso e a noite é curta. Eu espero ser capaz de terminar com isto antes do sol nascer.

Quando o monge novato, Gao, pela primeira vez visitou mestre Yakusan, Yakusan perguntou a ele: "De onde você vem?" Esta questão é formulada repetidas vezes: "De onde você vem?" Ela não se refere ao lugar, ela se refere ao espaço. Ela se refere à sua casa suprema, da qual você veio.

Gao disse: "De Nanyue," o nome da aldeia dele. Ele não poderia entender, ele estava chegando agora. Ele não tinha nenhuma idéia do porquê dos mestres perguntarem: "De onde você vem?" Eles estão perguntando: "Você tem meditado? Você tem estado no centro de seu Ser? Você tem olhado além do centro, para o espaço eterno do qual você está vindo?" Isto é perguntar de uma forma bastante sutil: "Você é um meditador? Você encontrou o centro de seu Ser, seu Buda?" Mas eles não perguntam desta forma, eles perguntam uma questão simples. Agora a resposta do novato decidirá, para o mestre, onde começar.

Gao disse: "De Nanyue."

Yakusan perguntou: "Para onde você está indo?"

Esta é outra questão da mesma categoria. Se você sabe para onde você está indo você saberá simultaneamente de onde você está vindo, porque é o mesmo lugar, de onde nós viemos e para onde nós vamos. É um círculo completo, o mesmo ponto é alcançado novamente, a mesma eternidade, o mesmo cosmos.

Um maremoto surge no oceano, desde onde ele está vindo? E, logo ele se dispersa de volta ao oceano. A fonte de onde você está vindo, e a fonte para onde você está indo é absolutamente a mesma.

Porque o novato falhou na primeira questão - ele não pode entendê-la - Yakusan perguntou: "Para onde você está indo? Se você desconhece de onde você está vindo, ao menos você deve saber para onde você está indo."

Gao respondeu: "Para Jiangling, receber os conceitos básicos."

Jiangling era uma espécie de universidade, onde grandes eruditos traduziam escrituras budistas para a China e Índia. Era o lugar mais famoso e eminente.

Então ele falou: "Eu estou indo para Jiangling para receber os conceitos básicos, os ensinamentos de Buda."

Yakusan então perguntou: "Qual é a intenção em receber os conhecimentos básicos?"

O que você vai fazer com os conhecimentos básicos? Você pode aprender todas as escrituras, mas isto não fará você sábio. Ao contrário, isto fará de você mais egotista e mais ignorante. O que você vai fazer ao receber os conteúdos básicos?

O Zen não está nem um pouco interessado no conhecimento.

Um mestre Zen queimou todas as escrituras budistas, e ele louvava Buda, ele amava Buda. E ele tinha se tornado iluminado como uma herança de Buda. Mas ele queimou todas as escrituras após sua iluminação porque ele viu: "Estas escrituras tem estado me obstruindo por anos, eu teria ficado iluminado a qualquer hora, mas por causa destas escrituras eu estive repetindo palavras, empilhando teorizações, enchendo-me com grande filosofia e isto foi se tornando uma grande muralha da China, muito difícil de passar além dela."

Quando ele se tornou iluminado sob um mestre, a primeira coisa foi queimar todas as escrituras. Isto não quer dizer que ele faltou com respeito à Buda, porque na manhã seguinte ele estava dançando à frente da estátua de Buda.

O mestre dele disse: "Mas você queimou as escrituras?". Ele disse: "Sim, eu queimei as escrituras porque eu fiquei consciente da verdade de Buda, ela não está nas escrituras, ela está em mim. E em profunda gratidão estou dançando em frente à estátua dele."

Uma outra história conta que um monge Zen queimou uma estátua de madeira de Buda porque a noite estava fria. O sacerdote veio e disse, "Você está maluco?"

Ele disse: "Talvez, mas a noite está fria demais. E você tem mais dois Budas em seu templo, eu só peguei um. Seja compassivo, traga, ao menos, mais um porque ainda há uma longa noite por vir e está ficando mais frio."

O sacerdote disse: "Eu pensei que você fosse um grande mestre, foi por isto que permiti a você ficar de noite no templo. Nunca tinha pensado, nem mesmo nos meus sonhos que um grande mestre poderia fazer uma coisa como essa. Você queimou meu Buda mais precioso. Ele era feito de madeira de sândalo."

O mestre pegou seu bastão e começou a procurar nas cinzas do Buda queimado.

O sacerdote disse: "O que você está fazendo agora?"

Ele disse: "Estou procurando os ossos dele."

O sacerdote disse: "Meu Deus, você está mesmo louco! Esta é uma estátua de madeira, ela não tem nenhum osso!" Ele falou: "Isto é o que eu estava dizendo: isto não é Buda, isto é só uma réplica de madeira. Basta você trazer outra estátua. Nenhuma de suas estátuas são budas, elas são somente madeiras esculpidas. Traga-a, a noite é por demais fria e um buda vivo está pedindo para você."

O sacerdote pensou que aquele homem iria queimar o templo inteiro. Ele o empurrou porta afora, fechou a porta...

O mestre falou: "Escute, você se arrependerá depois. Você está jogando fora o buda vivo em troca de estátuas de madeira. Mas... isto está bem, pela manhã vejo você." Nenhuma raiva, nenhum sentimento de humilhação.

Pela manhã, quando o sacerdote abre a porta, ele abre com muita cautela, olhando para onde aquele homem louco tinha ficado sentado. Ele não estava ali. Então ele abre as portas e, quando ele o viu, sentado do outro lado da estrada...

Havia uma marcação de estrada, e ele tinha coletado algumas flores selvagens e as tinha colocado na marcação, e ele estava fazendo seu louvor matinal: Buddham sharanam gachchhami.

O sacerdote disse: "Que homem é esse? Na noite ele queima o Buda e, agora, de frente para um marcador de estrada ele está dizendo: 'Eu cheguei aos pés de Buda.'" O sacerdote se aproximou dele, mas ele não o olhou. Ele estava em profunda meditação, em profunda serenidade. Enquanto o sol estava nascendo, alguma coisa dentro dele estava ficando cada vez mais leve. Quando ele abriu os olhos, o sacerdote olhou em seus olhos. Ele nunca havia visto tamanha beleza e profundidade semelhante. Ele nunca havia visto tanto silêncio, tanta graça.

Talvez ele tivesse cometido um erro. Ele tocou os pés do mestre. O mestre disse: "Falei a você, antes, que você se arrependeria. Você está jogando um buda para fora do templo e preservando os budas de madeira."

O Zen é muito honesto. Nem as estátuas podem ajudar, nem as escrituras podem ajudar. A única coisa que pode ajudar é ir mais profundamente dentro de você mesmo, se dando conta do céu interior e da liberdade que vem com isto, e a fragrância do além.

O mestre Yakuzan perguntou: "Qual é a intenção em receber os conhecimentos básicos? O que você vai fazer quando tiver aprendido? Quando você tiver recebido todos os ensinamentos de Buda o que você vai fazer? Qual é a meta?"

Gao respondeu: "Escapar do nascimento e da morte."

Ele deve ter ouvido isto, que esses budistas estão tentando sair do círculo do nascimento e da morte. E, obviamente, a maior parte das pessoas vive a vida dessa forma, o que cria mais e mais miséria. Toda a programação da humanidade é para a miséria, assim alguém começa a pensar em como sair do círculo do nascimento e da morte. Isto não vai realmente ajudar.

Você tem que aprender como sair da programação que a sociedade deu a você. Uma vez que você saia desta programação você está fora do nascimento e da morte, e do assim-chamado círculo. Mas sentindo-se miserável, ele pode ter pensado: "É melhor sair do nascimento e da morte."

Yakusan disse: "Há alguém que não recebe os conhecimentos básicos e não tem nascimento e morte para escapar - você sabe quem?" Ele está indicando em direção ao buda interno dele: "Há alguém que não recebe os conceitos básicos e não tem nascimento e morte para escapar - você conhece ele?"

Gao perguntou: "Então qual é a utilidade dos conhecimentos básicos de Buda?" Ele perdeu o ponto de novo. O mestre foi muito claro. Raramente os mestres Zen são tão claros, mas vendo que aquele homem é um iniciante, Yakusan deve ter sido muito claro, descomplicado.

Ele tinha dito exatamente isto: "Existe alguém que não recebe os conhecimento básicos e não tem nascimento e morte para escapar - você conhece ele?"

Ele está simplesmente perguntando: você conhece a si mesmo? Você sabe de alguém dentro de você que não precisa de nenhum conhecimento, que não precisa de escapar do nascimento e da morte, o qual já está mais além? Aquele que nunca nasceu e nunca morreu? Ele não precisa de nenhum conhecimento dos princípios básicos, ele conhece diretamente a própria Existência."

Mas Gao não podia entender.

Gao perguntou: "Então, qual é a utilidade dos conhecimentos básicos de Buda?" Ele começou a argumentar, o que é quase sempre o que acontece com os recém-chegados. Eles pensam que eles podem argumentar com o mestre. Eles não conhecem coisa alguma, mas a mente deles é cheia de lixo e de todos os argumentos e teorias e credos. Ele começou a argumentar sem escutar o que o mestre tinha dito. O argumento dele era: "Se há alguém que não precisa de conhecimentos básicos e que não precisa de sair do círculo de nascimento e morte, então, qual é a utilidade dos conhecimentos básicos de Buda?" Isso parece lógico, racional, mas só para aqueles que não conhecem meditação, só para aqueles que conhecem apenas a mente.

Yakusan disse: "Este novato ainda tem lábios e dentes." Lábios para falar, dentes para morder. Ele não entende nada, mas ao menos ele tem lábios que movem e ele tem dentes para morder ao argumentar.

Nisto, o novato inclinou-se e retirou-se. Essa inclinação tornou-se um ritual no Japão. Ele não entendeu coisa alguma. Ele tinha desperdiçado o tempo do mestre. O fato de ter-se inclinado não tem nenhuma gratidão nisto, é simplesmente uma formalidade, assim como quando você cumprimenta com as mãos, sem amor e ternura. Você já viu pessoas se cumprimentando? Mãos diferentes dão mensagens diferentes. Algumas mãos são tão frias, como se você estivesse segurando um galho morto de uma árvore, nada se move a partir daquelas mãos.

Algumas mãos são tão afetuosas e amorosas que você pode sentir um arrepio, alguma energia movendo dentro de você: elas estão prontas a compartilhar. E há mãos que sugam sua energia: depois de segurar mãos assim você sentirá uma estranha fraqueza vindo sobre você.

No Japão, inclinar-se se tornou um ritual. Perdeu a beleza de sua gratidão. Tenho visto isto acontecer por quase quinze anos agora, desde que os ocidentais começaram a vir até mim. Os indianos podem tocar os pés, mas muito raramente como uma gratidão, mais frequentemente apenas como uma formalidade. Milhares de pessoas tem tocado meus pés, e eu tenho estado observando as nuances sutis, as diferenças das energias deles. A maioria deles não tinha nenhuma gratidão, nada: era só uma coisa rotineira, na Índia. Quando os ocidentais começaram a vir até mim... Isto não é uma rotina no ocidente. O fato é que toda a cultura ocidental, e o sistema educacional, ensinam a você orgulho, ego. Isso é contra tocar os pés de alguém. Portanto, quando os ocidentais estiveram aqui, foi muito difícil para eles tocarem os pés, na mesma medida que foi muito fácil para os indianos tocarem os pés. Muito raramente um indiano realmente tocou os pés com gratidão, mas quando o ocidental sentia a gratidão emergindo nele o toque nos pés era mais autêntico, não era uma formalidade. Não era um programa predeterminado na mente dele. Em verdade, ele mesmo se espantava. O que ele está fazendo?... Contra toda a educação dele, contrário à toda cultura dele, ele está tocando os pés! Mas, quando você se depara com uma pessoa, que você sente gratidão, não há como, não há outro caminho para expressar isto. Este iniciante não entendeu nada, mas inclinou-se e retirou-se.

Dogo, então, veio em seguida e ficou junto a Yakusan, que lhe disse, "Este iniciante, que anda com dificuldade, que acaba de vir, apesar de tudo tem alguma vida nele."

Dogo disse: "Ele ainda não está acreditando inteiramente, você deveria testá-lo de novo, primeiro."

O mestre disse: "Ele pode não ter me entendido - este não é o problema, ele é um homem novo, mas uma coisa é certa: este iniciante que anda com dificuldade, que acaba de vir, apesar de tudo tem alguma vida nele." Ele veio de tão longe. Embora ele nada saiba, ele não conseguiu entender uma palavra, mas, ainda assim, ele tem alguma vida.

Dogo, seu discípulo antigo disse: "Ele ainda não está acreditando totalmente, você deveria testá-lo de novo, primeiro."

Quando o início da noite veio, Yakusan seguiu para o hall, e chamou: "Onde está o iniciante que veio mais cedo?"

Gao, então, veio em direção à reunião e ficou ali. E Yakusan disse a ele: "Ouvi dizer que Changan é muito barulhento." O lugar de onde ele estava vindo era um mercado, muito barulhento.

Gao disse: "Minha província é pacífica." Quando ele disse: "Minha província é muito pacífica", ele estava dizendo: "Meu território interior é muito pacífico. Não importa se o lugar do qual eu venho seja muito barulhento, o barulho é só externo. Dentro de mim, o espaço é muito pacífico."

Yakusan perguntou, como muita alegria: "Você ficou consciente disso lendo escrituras ou fazendo perguntas?" Ao que Gao respondeu: "Não aprendi isto lendo escrituras ou fazendo perguntas."

Yakusan falou: "Muitas pessoas não leem escrituras ou fazem perguntas, por que elas não alcançam isto?" Gao disse: "Não digo que elas não alcançam isto, apenas que elas não concordam em se interessar por isso."

Por que não são muitas, as pessoas que se tornam budas? Por que, se todo mundo é, intrinsecamente, um buda? Isso é só porque você está muito ocupado com outras coisas. Talvez, a sede não tenha aparecido, talvez você esteja com medo de se tornar um buda. Nesta multidão insana, tornar-se um buda é assumir um grande risco.

Gao diz: "Eu não digo que eles não alcançam - apenas que eles não concordam em se interessar por isso."

O mestre ficou muito alegre. Embora o iniciante não tivesse entendido o que Yakusan lhe dissera cedo, mas ele deve ter meditado sobre isto, tentando encontrar o que o mestre estava dizendo. "Por que falhei ali?" Mas, com a noite chegando, ele era uma pessoa totalmente diferente.

Pela manhã, ele tinha vindo como um recém-chegado; ao final da tarde, ele tinha se tornado um discípulo antigo, um discípulo muito antigo. Suas respostas mostram uma tremenda transformação, em apenas um dia.

Isto pode acontecer em um minuto!
Isto pode acontecer em um segundo!
Isto pode acontecer em menos de um segundo!

É só uma questão de quão intenso é o seu esforço para alcançar o seu centro.

Ele deve ter sentido, profundamente, a tristeza de ter se deparado com um mestre e ter perdido a oportunidade, e ele deve ter se sentido totalmente estúpido porque ele tinha começado a argumentar com o mestre.

Ele se purificou em apenas um dia, e no finalzinho da tarde, quando o mestre fez perguntas, ele era quase uma pessoa diferente. O mestre estava muito, muito alegre.

Tais buscadores são necessários no mundo. Estas são as pessoas que podem alcançar à altitude definitiva.

Eu sei que vocês estão aqui com uma intensa urgência, e esta urgência intensa me faz muito alegre. Sua primavera não está distante, logo vocês estarão cheios de florescimentos espirituais. Sua potencialidade chegará à sua realização. Você se verá como um buda! Esta não é uma questão de acreditar. Eu sou absolutamente contrário à crenças. Eu sou um cientista do mundo subjetivo.

Da mesma forma que a ciência não permite a crença, mas somente a pesquisa, investigação no mundo objetivo, eu sou um cientista do mundo subjetivo. Eu não permito nenhuma crença, mas somente a pesquisa, a busca.

E se você tem a sede, não há nenhuma necessidade de esperar. Antes que o sol nasça a sua Iluminação pode estar completa.


OSHO - Yakusan: Straight to the point of Enlightenment – cap. 4

sábado, novembro 17, 2012

Uma simples Meditação

Mooji


Quero introduzir uma forma, uma forma simples para que todos os seres humanos possam, outra vez, começar a sentir seu verdadeiro Ser. Isto é possível.

Eu estou aqui também para convidar as pessoas a viver esta descoberta para que possam experimentar o que aprenderam, para que possam experimentá-Lo diretamente dentro de si mesmos.

O ser humano pode começar encontrando aquele simples sentido de existência, o sentimento “Eu” ou “Eu Sou" - é um grande começo.

Simplesmente sentindo este sentido natural de existência dentro de si mesmo.
Permaneça unicamente com esse sentido natural de Ser.
Aquele que dentro de ti não está fazendo nenhum esforço.
Simplesmente “Eu Sou”, “Tu És”.

Permaneça com esta sensação e não se conecte a nenhum outro pensamento com nenhuma lembrança, nenhuma crença, nenhuma intenção e nenhum desejo.

Eles virão, mas você será consciente deles, não se prenda a eles, não faça nada.
Não pense que deveria estar repetindo um mantra, que deveria estar rezando.
Não.
Sem preces.
Sem repetir nenhum mantra.
Não tente fazer ou chegar a lugar algum.

Talvez no começo venham muitos pensamentos, ou muito ruído na mente.
Mas tudo bem, não é mal.
Permita o ruído estar ali.

Mas você permanece unicamente na Presença.
Permaneça unicamente na sua Presença.

E logo, esse sentido de Presença será mais forte e seus pensamentos, perguntas e todos esses ruídos se afastarão de você... E você sentirá unicamente Presença.

Você não será capaz de descrevê-lo, mas se sentirá como Paz.
E um sentimento natural de bem-estar, talvez até Alegria.
Haverá um espaço dentro de você.
Fique nele alguns minutos.

Depois você pode abrir seus olhos, respirar fundo e continuar sua vida.

Faça disto um hábito.

Isto não é uma nova religião.
Não é uma nova crença.
É uma simples meditação.

Se uma boa quantidade de pessoas fizesse isso, uma grande Beleza chegaria a este mundo.
 
 
 

terça-feira, novembro 13, 2012

Quando vem a Luz de Deus...

Joel S. Goldsmith
 

A Atividade de Deus é como uma luz tocando a escuridão. Não faz absolutamente nada com ela; não a cura, não a muda nem tampouco a remove. Apenas revela que ela era uma “ausência”. Eis com o quê se assemelha a Atividade de Deus; na cura, ela não sana uma doença: apenas revela que não havia doença nenhuma ali. Ela também não reforma um pecador; somente revela o homem de Deus, o ser que jamais pecou.
 
Há aquela parte de nós mesmos que nunca pecou, nunca esteve doente, nunca nasceu e que jamais morrerá; a Atividade de Deus consiste em revelar este homem espiritual. Aos nossos sentidos, ela pode se mostrar como removendo pecado, doença e carência; porém, aquilo se restringe ao que captam nossos limitados sentidos. Ela, realmente, não faz mais do que realiza a luz, quando faz dissipar a escuridão.
 
Assim, aquilo a que denominamos um ser humano, ou  "homem natural”, teve  existência unicamente na mente universal, que é separada e apartada de Deus. O todo da experiência humana é uma experiência imaginária, uma experiência de sonho, realizando-se na mente universal, que não tem o seu suporte em Deus. A prova disto é que, no momento que você aquietar a mente e abrir a porta para que o Espírito de Deus entre, tal homem não estará mais lá . Aquele homem do pecado, da doença, e da morte estará tão ausente quanto esteve a escuridão, ao ser tocada pela luz. Dizemos que “o velho homem” "morreu" e “o novo homem” "renasceu"; porém, para onde teria ido “o velho homem”? A lugar nenhum! Ele já era ausente, desde o começo.
 
 

sábado, novembro 10, 2012

Que todos os seres sejam felizes!



 
 
Letra:
Om sarve bhavantu sukhinaha
Sarve santu santu niramaya
Sarve badhrani pasyantu
Ma kaschid dukha bhag bhavet


Tradução:
"Que todos os seres sejam felizes;
Que a existência possa suprir todas as suas necessidades;
Que todos possam encontrar o Deus interior."



quinta-feira, novembro 08, 2012

O que é a Verdade? (Osho)

Pergunta: Querido Osho, por vezes, enquanto estou apenas sentado aqui, surge a pergunta na mente: O que é a verdade? Mas, ao mesmo tempo em que a pergunta surge, eu percebo que não sou sequer capaz de perguntar. Nesses momentos em que a questão surge tão fortemente, se você estivesse por perto eu lhe faria a pergunta mesmo assim. E nesses momentos, se você não respondesse, apenas sinto que eu teria que agarrá-lo pela a barba ou pelo colar e perguntar: "O que é a verdade, OSHO?"

 
 
 
 
Osho: Essa é a pergunta mais importante que pode surgir na mente de alguém, mas não há resposta para isso. A questão mais importante, a questão mais fundamental – e suprema – não pode ter qualquer resposta. É por isso que ela é suprema.

Quando Pôncio Pilatos perguntou a Jesus “O que é a verdade?”, Jesus permaneceu em siêncio. Não só isso, a história diz que quando Pôncio Pilatos fez a pergunta “O que é a verdade?”, ele não esperou para ouvir a resposta. Ele saiu da sala e foi embora. Isso é muito estranho. Pôncio Pilatos também pensa que não pode haver uma resposta para a questão, é por isso que ele não esperou pela resposta. Jesus permaneceu em silêncio porque ele também sabe que a pergunta não pode ser respondida.
 
Mas essas duas compreensões não são as mesmas, porque essas duas pessoas são diametralmente opostas. Pôncio Pilatos pensa que a pergunta não pode ser repondida porque não existe algo tal como a verdade; então como seria possível a você dar uma resposta? Essa é a mente lógica, a mente romana. Jesus permanece em silêncio não porque a verdade não exista, mas porque a verdade é tão vasta, que ela não pode ser definida. A verdade é tão grande, tão enorme, que não pode ser confinada em uma palavra, não pode nem mesmo ser confinada na combinação de um milhão de palavras. Ela não pode ser reduzida à linguagem. Ela está lá, definitivamente. O indivíduo pode sê-la, mas não pode dizer algo sobre ela.
 
Por duas razões diferentes eles se comportaram quase da mesma forma: Pilatos não esperou para ouvir a resposta, ele já sabia que não há verdade. Jesus permanece em silêncio porque ele conhece a verdade, e sabe que nada é possível ser dito.

Chilvilas foi quem fez essa pergunta. A questão é absolutamente significativa. Não existe questão maior do que essa, porque não há religião superior à verdade. A questão tem de ser entendida, tem de ser analisada. Ao analisar a questão, e tentar compreender a pergunta em si, você pode ter um insight sobre o que é a verdade. Eu não vou responder isso, eu não posso responder a pergunta, ninguém pode responder. Mas podemos penetrar fundo na questão. Indo fundo na questão, a questão vai começar a desaparecer. E quando a pergunta tiver desaparecido, você vai encontrar a resposta lá no âmago do seu coração – você é a verdade, assim como você pode perdê-la? Talvez você apenas tenha se esquecido dela, talvez você tenha apenas perdido o rastro dela;  você pode ter se esquecido de como entrar em seu próprio ser, em sua própria verdade.

A verdade não é uma hipótese, a verdade não é um dogma. A vedade não é hindu, nem cristã, tampouco mulçumana. A verdade não é minha nem sua. A verdade não pertence a ninguém, mas todo mundo pertence à verdade. A verdade significa aquilo que é: esse é exatamente o significado da palavra. Ela deriva de uma raiz latina, verus. Verus significa: aquilo que é. Em inglês, algumas palavras são derivadas da raiz latina verus: was, were – elas vêm de verus. Verus significa aquilo que é, sem interpretações. Quando entra a interpretação, o que você passa a conhecer é a realidade, e não a verdade. Essa é a diferença entre a verdade e a realidade. A realidade é verdade interpretada.

Assim, no momento em que você responde à questão “O que é a verdade”, a verdade se converte em realidade; ela já não é mais verdade. A interpretação entrou nela, a mente tornou-a colorida. E as realidades são muitas, existem tantas realidades quantas mentes possam existir. Existem multi-realidades. A verdade é uma porque é conhecida apenas quando a mente não está lá. É a mente que o mantém separado de mim, separado dos outros, separado da existência. Se você olhar através da mente, a mente vai lhe proporcionar uma fotografia verdade. Essa será apenas uma foto, uma imagem do que é. E, claro, a fotografia depende da câmera, do filme utilizado, dos elementos químicos, da forma como foi desenvolvido, de como foi impressa, de quem a fez... Mil e uma coisas entram no processo. Então a verdade é convertida em realidade.

A palavra realidade também é bela de ser compreendida. Ela vem da raiz res, que significa “coisa” ou “coisas”. A verdade não é uma coisa. Uma vez interpretada, uma vez que a mente a tenha agarrado, a tenha definido e demarcado, ela se torna uma coisa.

Quando você se apaixona por uma mulher, há ali alguma verdade – se você se apaixonou naturalmente, absolutamente sem querer, sem ter feito coisa alguma de sua parte, e sem ter pensado nisso de modo algum... De repente você vê uma mulher: você a olha nos olhos, ela também olha nos seus, e subitamente algo clica. Você não está fazendo nada daquilo, você está simplesmente tomado/possuído pelo que está acontecendo, e quando menos espera se vê completamente dentro daquilo. Aquilo nada teve a ver com você. Seu ego não está envolvido, ao menos não naquele início, quando o amor ainda é virgem. Naquele momento há verdade, e não há interpretação. É por isso que o amor permanece indefinível.

Logo a mente entra, toma posse de você e começa a administrar as coisas. Você começa a pensar sobre a garota como sua namorada, você começa a pensar em como se casar, e começa a pensar sobre ela como sua esposa. Agora, tudo isso são coisas: a namorada, a esposa – essas são as coisas. A verdade não está mais lá, foi recuada para um plano secundário. As “coisas” passaram a ser mais importantes. O definível é mais seguro, o indefinível é inseguro. Você começou a matar/envenenar a verdade. Cedo ou tarde haverá uma esposa e um marido, que são suas coisas. Mas a beleza se foi, a alegria desapareceu, a lua de mel acabou.

A lua de mel termina no exato momento em que a verdade se torna realidade, quando o amor se torna um relacionamento. A luz de mel é muito curta, infelizmente – eu não estou me referindo sobre a luz de mel para onde vão você e seu cônjuge. A lua de mel é muito curta. Ela estava lá por um breve momento. A pureza e a beleza que ela carrega, aquela pureza cristalina, divina e transcendente – é pertencente à eternidade, não é do tempo. Não faz parte desta vida mundana, é como um raio trazendo luz para um lugar escuro. Ela vem do transcendental. É absolutamente apropriado chamar o amor de Deus, porque o amor é a verdade. A coisa mais próxima da verdade a que você pode chegar ma vida comum é o amor.

Chilvilas pergunta: “O que é a verdade?”

A pergunta deve desaparecer; somente então você saberá.

Quando você pergunta “O que é a verdade?”, o que você está peguntando? Tente entender isso. Se eu digo que “A” é verdade, “B” é verdade, “C” é verdade... isso seria realmente uma resposta? Se eu disser que A é a verdade, então A certamente não pode ser a verdade: é apenas algo que estou usando como sinônimo da verdade. Se A for um sinônimo total e completo da verdade, então haverá uma tautologia. Então eu poderia dizer: “A verdade é a verdade”, mas isso de nada adiantaria, seria só uma tolice sem sentido. Se ambos forem exatamente o mesmo, ou seja, se A for exatamente a verdade, então isso significará que “a verdade é a verdade”. Por outro lado, se A for diferente, ao invés de exatamente a verdade, então eu estarei falsificando e enganando. Então dizer “A é a vedade” será apenas aproximado. E lembre-se, em se tratando da verdade, não pode haver nada que seja aproximado. Ou é a verdade, ou não é. Logo, mesmo que tentasse lhe responder com significado aproximado, eu não poderia dizer que A é a verdade.

Eu não posso nem mesmo dizer que "Deus é a verdade", pois se Deus é a verdade, isso seria uma tautologia, significando que "A verdade é a verdade". Nesse caso, apesar de eu estar lhe dizendo a resposta, não estaria dizendo realmente nada. Se, todavia, Deus é diferente da verdade, então eu poderia dizer alguma coisa, mas então eu estaria dizendo algo errado/falso. Porque, se Deus é diferente da verdade, como Ele poderia ser a verdade? Se eu disser que minha resposta é aproximada, linguisticamente parece tudo bem, mas não é certo. "Aproximado" significa que um pouco de mentira está lá, que há algo falso lá. Do contrário, o que mais poderia impedir uma verdade cem por cento? Se é 99 por cento verdade, então existe algo que não é verdade. E a verdade e a mentira não podem existir juntos, assim como a escuridão e a luz não podem existir juntos - porque a escuridão nada mais é do que ausência. Ausência e presença não podem existir juntos, mentira e verdade não podem existir juntos. A inverdade nada mais é do que a ausência da verdade.

Portanto, nenhuma resposta é possível. Foi por isso que Jesus permaneceu em silêncio. Mas se você puder olhar para o silêncio de Jesus com simpatia profunda, você perceberá que há uma resposta. O silêncio é a resposta. Jesus está dizendo: "Fique silencioso, assim como eu estou silencioso, e você vai saber". Note que ele não está dizendo isso com palavras. Esse é um gesto muito, muito Zen. Naquele momento em que Jesus permaneceu em silêncio, ele se colocou muito perto da abordagem Zen, e também da abordagem budista. Naquele momento ele era um Buda. Em sua vida, Buda nunca respondeu a perguntas como esta. Ele tinha 11 perguntas enumeradas: aonde quer que ele fosse, seus discípulos iam na frente e declaravam às pessoas: "Buda está vindo, mas nunca perguntem a ele essas 11 questões" - questões que são fundamentais, questões que são realmente significativas. Você poderia perguntar qualquer outra coisa e Buda se prontificaria imediatamente a responder. Mas não pergunte sobre o fundamental, porque o fundamental pode apenas ser experimentado. E a verdade é de todo o mais fundamental, o mais essencial; a própria substância da existência é o que é a verdade.
 
Analise bem a questão. A questão é realmente significativa, e está surgindo em seu coração: "O que é a verdade?". Um desejo de conhecer aquilo que é está surgindo. Não deixe de lado a sua pergunta, vá bem fundo nela. Childvilas, sempre que a pergunta surgir novamente, feche os seus olhos, e olhe atentamente para a questão. Deixe que a questão esteja muito, bastante focada... "O que é a verdade?"... E deixe haver grande concentração. Esqueça tudo, como se toda a sua vida dependesse dessa única pergunta – "O que é a verdade?". Permita que isso se torne uma questão de vida ou morte. E não tente respondê-la, porque você não sabe a resposta.
 
Muitas respostas podem vir para você, a mente sempre tentará supri-lo com respostas. Mas veja o fato de que você não conhece a resposta – é justamente por isso que você está perguntando. Isso não é óbvio? Então, como pode a sua mente fornecer a resposta? Perceba esse fato e tenha-o em mente. A mente não sabe, não conhece; desse modo, sempre que ela vier com respostas, diga a ela: "Fique quieta". Você não conhece a resposta, daí a sua pergunta.
 
Portanto, não seja enganado pelos brinquedos da mente. Ela o provê com muitos brinquedos; ela diz: "Veja, está escrito na Bíblia. Veja, está escrito nos Upanishads. A resposta é X. Veja, Lao Tzu escreveu que Y, essa é a resposta." A mente pode atirar todos os tipos de escrituras sobre você, pode fazer citações, pode usufruir da memória. Em sua vida, você ouviu falar sobre bastantes coisas, leu muito sobre várias coisas; a mente carrega todas essas memórias. Ela pode repetir tudo de forma mecânica. Mas olhe de perto para este fenômeno: a mente não sabe realmente nada, e tudo o que a mente está repetindo nada mais é do que conhecimento emprestado.
 
Cuidado com a mente. A mente fará citações, ela tentará provar de todas as formas possíveis ter a resposta certa pra tudo. A mente sabe tudo sem saber nada. A mente é um fingidor, uma enganadora. Olhe para este outro fenômeno (a isso eu chamo insight): não é uma questão de pensamento. Sempre que você pensar sobre isso, é novamente a mente. Você deve ver (intensamente e de uma vez por todas) através de toda atuação, de todo funcionamento e do mecanismo da mente. A sua visão tem de apreender tudo de uma vez, do contrário sua visão será superficial. E uma visão superficial não é realmente uma visão, é um pensamento. Você tem de compreender/olhar profundamente para o fenômeno: para o funcionamento da mente, o modo como a mente atua/trabalha. Ela toma conhecimento emprestado daqui e dali, e segue acumulando conhecimento da mesma forma como um ferro velho acumula todo tipo de entulho. A mente é como o dono de um ferro velho. Ela se enche de conhecimento, e sempre que lhe ocorre uma pergunta que é realmente importante, a mente o providencia com uma resposta sem importância – fútil, superficial, lixo.
 
Um homem comprou um papagaio em uma loja de animais. O proprietário da loja garantiu a ele que o pássaro iria aprender a dizer “alô” em apenas meia hora. Ao voltar para casa ele passou uma hora cantando “alô” para o pássaro, mas o pássaro não tinha pronunciado uma palavra sequer. Quando o homem foi desistindo e se afastando em grande frustração, o pássaro disse: “o número está ocupado.”
 
Um papagaio é um papagaio. Ele deve ter ouvido aquelas palavras na loja de animais. E este homem seguia dizendo “olá, olá, olá”, e durante todo o tempo o pássaro estava escutando, apenas esperando ele parar. Então ele poderia dizer, “o número está ocupado!”.
 
Você pode continuar perguntando à mente, “O que é a verdade, o que é a verdade, o que é a verdade?”. E no instante em que você parar, a mente imediatamente dirá: “o número está ocupado”, ou algo parecido. Tenha cuidado com a mente.
 
A mente é o diabo, ela é o demônio, não existe nenhum outro. E é a sua mente. Essa percepção/insight tem de ser desenvolvido: de olhar inteiramente para ela de uma única e só vez, inteiramente, totalmente, por completo. Corte a mente em duas com um golpe forte e afiado da espada. Essa espada é a presença, a consciência. Corte a mente em duas e siga em frente atravessando-a, para além dela! E, ao atravessá-la, se você puder ir além da mente, e um momento de não-mente eclodir para você, subitamente você verá a resposta – não uma resposta verbal, não um texto citado entre aspas, mas uma resposta autenticamente sua, uma experiência. A verdade é uma experiência existencial.
 
A questão é imensamente significante, mas você tem que ser muito respeitoso para com a questão. Não tenha pressa para encontrar qualquer resposta, caso contrário alguns entulhos acabarão por matar a resposta. Não permita que a sua mente destrua a sua pergunta. A maneira que a mente tem de destruir a pergunta é fornecendo uma resposta sem vida, sem experiência.
 
Você é a verdade! Mas a realização/constatação disso somente pode acontecer quando você estiver em completo e total silêncio, quando não há nem mesmo um único pensamento, quando a mente não tem nada a dizer, quando não há nem mesmo uma única ondulação em sua consciência. Quando não há ondulação em sua consciência, sua consciência permanece sem distorções. Quando há uma ondulação, existe uma distorção.
 
Basta ir a um lago. Fique em pé sobre a margem do lago, e olhe para o seu reflexo. Se houver ondulações no lago e o vento estiver soprando, o seu reflexo ficará trêmulo. Você não poderá definir onde exatamente estão as coisas – qual parte é o seu nariz e qual parte são os seus olhos – poderá apenas tentar adivinhar. Mas quando o lago está silencioso e o vento não está soprando e não há uma única ondulação na superfície do lago, de repente você está lá. Inteiramente, em absoluta perfeição, o seu reflexo está lá. O lago se torna um espelho.
 
Sempre que houver um pensamento em movimento em sua consciência, as coisas ficarão distorcidas. E há muitos pensamentos, milhões de pensamentos estão correndo continuamente, e para eles sempre é a hora do rush. Todas as vinte quatro horas do dia são a hora do rush, e o tráfego continua infindavelmente por todas as horas do dia. E cada pensamento está associado com milhares de outros pensamentos; eles estão todos de mãos dadas relacionando-se entre si, completamente interligados, e toda essa multidão está correndo em volta de você. Como você pode saber o que é a verdade? Saia dessa multidão.
 
Isso é o que é meditação, é disso que a meditação se trata: uma consciência sem mente, uma consciência sem pensamentos, uma consciência firme sem oscilações, límpida como um lago. Então subitamente a resposta está lá em toda sua beleza e bendição. Então a verdade é conhecida – chame-a Deus, Nirvana, ou use qualquer outro nome que você preferir. De repente ela está lá, simplesmente; e está lá na forma de uma experiência. Você está nela e ela está em você.
 
Utilize bem a sua pergunta. Tire dela todo o proveito possível. Torne-a cada vez mais penetrante e focada; coloque tudo em jogo a fim de que a mente não possa enganá-lo com suas respostas superficiais. Uma vez que a mente desaparecer, quando ela não mais estiver jogando com seus velhos truques, você vai saber o que é a verdade. Você saberá disso em silêncio. Você saberá em um estado de consciência sem pensamentos.

Osho - The Heart Sutra