"MAIOR É O QUE ESTÁ EM VÓS DO QUE O QUE ESTÁ NO MUNDO." (I JOÃO 4:4)

quinta-feira, setembro 14, 2017

"Quem somos" na Realidade e na Representação

- Gustavo -


Na postagem anterior, o nosso amigo SERgio fez o seguinte comentário:

Isso é o que precisamos "treinar"! 
Perceber sem a interferência da mente comum. 
Perceber "além" ou "através" das aparências. 
Perceber, a partir da Consciência que somos, que tudo é a mesma Consciência.
Pode não ser fácil para aquele cuja a Consciência não aparece como "ser humano desperto". 
Até mesmo os tidos como "acordados" (e eu estive com alguns), quando conversamos fora do "contexto de Satsang", como normalmente é chamado, a conversa fluía em termos de visão comum. Claro que para ficar "utilitário" fora (talvez) necessário.
"Alguém" poderia discorrer mais sobre isso.
Talvez o Silvano, ou você mesmo Gustavo... ou "outro". 
Reverências!

Atendendo ao pedido d'Aquele que aparece como o nosso querido amigo, seguem considerações sobre algumas questões importantes relativas ao conteúdo do texto anterior, de Joel Goldsmith:

Caro SERgio,

Este texto de Goldsmith é realmente profundo! Não me surpreende que um texto dessa magnitude tenha chamado sua atenção para nos proporcionar uma reflexão do que ele contém.

Eu escolhi esse texto de Goldsmith porque ele complementa e enfatiza (com palavras diferentes) o que foi dito por Masaharu Taniguchi nos parágrafos finais do post anterior.

Uma verdade essencial a ser assimilada, por nós que buscamos a Verdade, é que a visão do Todo (aquilo que chamamos de Eu) somente emerge em nossa percepção quando conseguimos levar em consideração todos os nossos irmãos (ou seja, o "outro"). A Verdade que buscamos para nós deve incluir em si todos os seres, sem exceção. Somente assim é que surge a percepção do Eu. A mente egoica, visando manter a separação entre "eu" e o "outro", tende a querer associar a Verdade com aquele "eu" e não levar em consideração o "outro". Dessa forma, a percepção do Eu não pode emergir. O sentido de "Eu" somente surge quando nossa percepção da verdade inclui  tanto o "eu" quanto o "outro". Numa equação simples, Eu = "eu" + "outros". Desaparecendo a linha ou fronteira que separa o "eu" e o "outro", surge o Eu que "aparece como" todos.

Manter o "outro" separado do "eu" é uma das estratégias do ego para nos manter presos na mente. 

Por isso, Masaharu Taniguchi disse:

"Para fazermos ressurgir o paraíso, não basta reconhecermos a nós próprios como sendo um 'ser espiritual', um ser divino dotado de Vida eterna e, portanto, digno de habitar o jardim do Éden. É preciso contemplar todas as pessoas como sendo filhos de Deus, dignos de viver no paraíso. Jesus Cristo disse: 'Quem não reverencia o filho de Deus, não reverencia o Deus-Pai'. Aquele que não é capaz de reverenciar o ser humano como filho de Deus, também não é capaz de reverenciar verdadeiramente o Deus-Pai que rege o universo. Enquanto não formos capazes de reverenciar todas as pessoas, não poderemos fazer com que este mundo se transforme em paraíso. Despertar para a Verdade de que 'o homem é filho de Deus' não é conscientizar-se apenas da natureza divina de si mesmo, mas sim compreender que 'todas as pessoas são filhos de Deus' e viver em harmonia com todos, amando-os e reverenciando-os."

Por sua vez, Goldsmith diz que: 

"... dar falso testemunho contra o próximo é declarar que ele é humano, finito, que tem falhas, e que é menos do que o filho de Deus. Violando essa lei cósmica, atraímos nossa própria punição, porque a verdade que diz respeito ao 'outro', diz respeito também a 'mim', uma vez que há somente um Eu e um Ser. A única maneira de evitar falso testemunho contra o próximo é perceber que o Cristo (filho de Deus) é nosso próximo, que nosso próximo é um ser espiritual, exatamente como nós. Ele pode não saber, nós podemos não saber, mas a verdade é: Eu Sou o Espírito, Eu Sou a Alma, Eu Sou a Consciência, Eu Sou Deus Expresso - assim como o nosso próximo."

Essa é a visão que devemos treinar, exercitar, buscar manter sempre conosco.

O interessante a se notar é que: para os que são "acordados" (iluminados), não existe pessoa ou ser que não seja iluminado. Um ser desperto vê/percebe todos os outros seres como estando despertos. Em outras palavras, percebe somente a Si mesmo. Ele pode até conversar frente-a-frente com um indivíduo não-desperto, pode tentar auxiliar esse indivíduo a tornar-se desperto, mas não levará isso a sério. Ele estará apenas "jogando", ou seja, apenas interagindo na representação.

A percepção iluminada é absoluta. Quando ela se realiza em você, simultaneamente se realiza em todos os seres, iluminando tudo. Ao se tornar consciente, você também perceberá todos os seres estando conscientes. Isso ocorre porque você é um universo inteiro e infinito. Por exemplo: suponhamos que eu não esteja iluminado, e me encontre com você que está iluminado. Nesse caso, haverá a presença de dois universos infinitos - o meu universo e o seu universo. Se você estiver iluminado, eu (que estou aparecendo no seu universo) estarei iluminado. Se o seu universo estiver iluminado, eu estarei iluminado para você. Você me perceberá assim porque estará vendo do referencial do seu universo, que inclui a mim. E eu, permanecendo no referencial do meu universo, não poderei perceber a mim nem a você como iluminados, enquanto o meu universo não se iluminar. 

O modo como o meu universo se torna iluminado não se dá de modo objetivo (com mudanças exteriores ocorrendo nele), e sim de modo subjetivo (quando eu obtenho uma certa percepção dele). Se você olhar pela janela e quiser ver a paisagem da cor vermelha, não precisa empreender o duro trabalho de pintar todo o cenário de vermelho, basta colocar um óculos com lentes vermelhas e a paisagem toda se torna vermelha instantaneamente. De modo análogo, é assim que o universo se torna iluminado para nós: quando iluminamos a nossa percepção.

Joel Goldsmith diz que "Deus aparece como o Ser individual", e que o Ser individual compreende o infinito, a totalidade do universo inteiro. É por isso que cada um de nós somos esse Ser Individual, esse Universo infinito. Tudo o que precisamos fazer é iluminar a percepção que temos do universo que somos.

E o que fazer para iluminar a percepção que temos de nosso universo?

Primeiro precisamos compreender uma verdade essencial acerca de Quem realmente somos (quando não levamos em conta a existência da Representação), e também de Quem somos (quando levamos em conta a presença da Representação).

O Ser que verdadeiramente somos existe desde "antes que a Representação existisse", e existe como um Ser absolutamente puro, iluminado, imaculado, sagrado e perfeito. É a nossa Identidade Celestial, em que Deus-Pai (Ser Universal) aparece como o Filho (Ser Individual). Nessa Realidade (que existe antes da Representação), Deus-Pai e o Filho são exatamente a mesma coisa, o mesmo Ser. Tudo o que Deus é, nós, enquanto Filhos de Deus, também o somos. Deus compartilha conosco tudo quanto Ele é e tem. Nossa Realidade e Identidade celestiais é uma existência gloriosa. Essa é a Verdade exata e imutável sobre de cada um de nós enquanto Seres "anteriores à Representação". É a Verdade exata sobre nós, assim como na matemática o 4 é o único resultado correto e possível para a equação 2+2.

Mas, então, eis que surge a Representação. Uma vez que a Representação entra em cena, muitas coisas se tornam possíveis, até mesmo o que não existe de verdade. A Representação tem a característica de ser como um "quadro-negro" ou "folha de papel em branco", e nela é possível escrever aquilo que se quiser. Se você escrever num quadro negro que 2+2 = 4 (ou seja, a verdade), ele irá registrar isso. Por outro lado, se você escrever 2+2 = 5 (ou seja, o erro), ele também irá registrar isso. O propósito da Representação é proporcionar a existência/experiência de tudo o que não é verdadeiro. Mesmo que a matemática tenha o 4 como o único resultado possível/correto para a conta 2+2, o quadro-negro aceitará a presença da equação 2+2 = 5, caso alguém assim queira assinalar. 

Por isso, quando levamos em conta a Representação (o quadro-negro), o Ser que somos não é necessariamente aquela Identidade Celestial perfeita. Ao adentrarmos a Representação, assumimos o nosso Ser como algo absolutamente indefinível, capaz de se revestir tanto de uma identidade correspondente à Verdade, como também de uma identidade correspondente à inverdade. No âmbito da Representação, o Ser que somos é como um vácuo, um espaço vazio e sem forma, capaz de assumir em Si os mais diversos conteúdos. Isso é o que torna possível estarmos no universo da Representação, caso contrário ficaríamos somente na Realidade que existe desde "antes" da Representação.

É por isso que determinados ensinamentos (que não levam em conta a Representação) mencionam de forma taxativa que a nossa real identidade é a de Deus (ou Filhos de Deus), e enfatizam a nossa realidade divina como Verdade definitiva e imutável. Se esses ensinamentos fossem indagados sobre a pergunta "Quem sou eu?", eles diriam: "Você é Deus, o Filho de Deus perfeito, vivendo aqui e agora no reino de Deus".

Por sua vez, se outros ensinamentos (os quais levam em conta a Representação) fossem indagados sobre a pergunta "Quem sou eu?", responderiam: "Não tente descobrir Quem é você, não tente obter uma resposta para essa pergunta. Nem mesmo assuma que você é 'Brahma', ou o 'Atma', ou o 'Divino'. Apenas fique com a pergunta, até que ela finalmente desapareça, e quando a pergunta desaparecer somente então você saberá quem é". E a pergunta somente desaparece quando nós também desaparecemos, ou seja, quando nos percebemos sendo esse imenso Vazio sem conteúdo algum (e, por isso, capaz de todos os conteúdos). 

Em um dos livros de "A Verdade da Vida", Masaharu Taniguchi explica que "o homem é um ser enigmático, misterioso, híbrido, capaz de perambular entre dois universos" (unidade e separatividade). Ao experienciar sua real identidade na Representação, ele desejou expressar ao mundo o seu despertar e assim registrou em forma de poema, dizendo: "Abandono-me ao sabor das ondas, e, completamente entregue a elas, fito o céu azul. Nada vejo, mas tudo existe. Sendo vazio e, ao mesmo tempo, pleno; sendo pleno e, ao mesmo tempo, vazio - um ser que está vivo e flutua, um ser misterioso e extraordinário: isto sou Eu." Se o homem é capaz de perambular entre dois universos, então ele não é a imagem que aparece na Representação quando mergulha no universo da divindade; tampouco é a imagem que surge quando imerge no universo da separatividade. Enquanto estiver na Representação, ele é aquela identidade vazia, misteriosa, indefinível, capaz de assumir ambos os conteúdos. Por isso, ao mesmo tempo que é vazio, é completamente cheio. Mas essa Verdade só é válida do ponto de vista da Representação. Na Matemática 2+2 é igual a 4, e é impossível que 2+2 seja igual a 5. Mas no quadro-negro é possível a equação 2+2 ser igual a 5. Da mesma forma, na Realidade Celestial é impossível sermos algo separado ou diferente do que Deus é. Mas na Representação podemos existir ou experienciar nosso ser como sendo algo separado ou diferente Dele. Consequentemente, também podemos experimentar o nosso Ser como unido e idêntico a Deus. A Representação foi feita para possibilitar a existência da separatividade (Ego) e também para que a Divindade (Eu) pudesse Se expressar plenamente através de cada ser, coisa e fato.

Por isso, na Representação, somos aquele ser (o Observador) misterioso, vazio, híbrido, indefinível, capaz de assumir conteúdos condizentes com a Realidade, e conteúdos condizentes com a irrealidade.

Uma vez que assimilemos isso, podemos compreender que o nosso Ser pode se alinhar tanto com a Verdade, como também pode se alinhar com a inverdade. Se estivermos alinhados com a irrealidade, devemos fazer um trabalho de esvaziamento, a fim de que nos tornemos disponíveis para receber em nós a Verdade, somente então é que passaremos a expressá-La aqui na Representação. Não é incomum vermos tantos ensinamentos discorrendo sobre a importância do "Vazio" e incentivando os buscadores a aprenderem a se esvaziar. Somente quando nos tornamos vazios (do conteúdo correspondente à inverdade) é que nos colocamos em condição de receber/acessar a Verdade e manifestá-la no universo da Representação.

O ego tem o papel de utilizar todas as estratégias possíveis para nos manter alinhados com a inverdade como, por exemplo, proteger a linha ou fronteira que demarca a existência do "eu" e do "outro". Ao proteger essa fronteira e mantê-la intacta, é impossível surgir a noção ou percepção do Eu. Pois, como já vimos, Eu = "eu" + "outros".

O ego tem uma determinada visão do universo, ao passo que o Eu tem uma outra visão do mesmo universo. O universo em si não é nada, não tem significado algum. A percepção é tudo(!). Nós é que conferimos significado ao universo mediante a visão com que olhamos para ele. Se conseguirmos alterar a lente de percepção com que enxergamos o universo (trocando as lentes da separatividade por uma lente iluminada), o universo inteiro se tornará iluminado, e assim perceberemos Eu aparecendo como tudo e todos neste próprio universo em que vivemos.

E muitas ferramentas nos são oferecidas. Há várias chaves de percepção que, se colocadas em prática, alinham a nossa visão com a percepção que o Eu tem do universo. Algumas delas:

* Pensar, falar e agir com Amor (ser Amor).
* Perdoar verdadeiramente (Purificar a  mente de conteúdos pesados e negativos, como raiva, ciúme, ódio, inveja, mágoas, ressentimentos, etc.)
* Não julgar (Pois, como já dito, o universo não é nada por si mesmo. Tudo depende da percepção com que se olha para ele. Sempre que julgarmos algo, estaremos vendo apenas um subproduto de nossa própria visão).
* Manter em mente somente pensamentos da Verdade (Tudo aquilo que sabemos ser verdadeiro na Realidade Celestial) e buscar manifestar nossas vidas em conformidade com essa Verdade.
* Sempre levar em consideração o outro (Ou seja, saber que todos estão incluídos na Verdade, pois ela é impessoal. O Todo somente se revela quando se reúnem todas as suas "partes").
* Gratidão (assim como o amor, a gratidão é uma chave poderosa para nos alinhar com a Verdade divina)
* Estar sempre atento ao momento presente, e aceitá-lo tal como ele é (A Verdade existe sempre aqui e agora).
* Ação dhármica (agir sem visar recompensas pessoais, com renúncia aos frutos da ação, ou seja com desapego. Pois o "eu" não existe. Só existe o Todo).
* Receber a Deeksha (a energia da Deeksha acelera o processo do despertar da consciência).
* E, claro, um desejo/amor ardente e inquebrantável por querer conhecer a Verdade, Deus.

Essas são algumas das principais chaves de acesso ao Eu, que são recomendadas pelos mais variados ensinamentos. A cada vez que exercitamos uma dessas chaves, nosso ser se alinha/sintoniza um pouco mais com a Verdade. São essas as coisas que precisamos treinar.

Também é muito importante lembrar o que o Silvano disse: "A chamada 'mente comum nem mesmo interfere quando estamos percebendo a partir da Consciência". Isso significa que não precisamos aniquilar a visão mental para desfrutarmos da percepção consciencial. Podemos perceber consciencialmente independente da interferência da mente comum [mente do personagem], pois a interferência causada pela mente do personagem é apenas aparente. Isso é algo que pouquíssimos ensinamentos revelam aos buscadores. Mas é a verdade. Podemos nos perceber sendo o Ator, e mesmo assim continuar representando o papel de nossos personagens aqui na Representação. Foi em razão disso que Joel Goldsmith disse:

"O nosso próximo [o outro personagem] pode não saber, nós podemos não saber [ou seja, podemos estar representando o papel de um personagem que ainda não despertou para a Verdade, e mesmo assim estarmos conscientes de Quem somos. Pois quem está consciente de Si mesmo é o Ser, e não o personagem], mas a verdade é: Eu Sou o Espírito, Eu Sou a Alma, Eu Sou a Consciência, Eu Sou Deus Expresso - assim como o nosso próximo."

Todas essas coisas são algo que vale a pena ponderar, contemplar, e meditar.

Namastê!


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